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publicado dia 17 de outubro de 2022

Crianças desbravam ruas de São Paulo com projeto Motoca na Praça

Reportagem:

Logo do prêmio territóriosNa contramão das expectativas, de vez em quando é possível se deparar com uma legião de crianças pedalando pelas ruas e calçadas do entorno da Praça da República, no centro de São Paulo (SP), em triciclos coloridos. É o Motoca na Praça! 

Há três anos, a EMEI Armando de Arruda Pereira coloca o bloco na rua e leva as crianças da Educação Infantil a desbravarem a região, reivindicando o seu lugar no direito à cidade e ao brincar, com o projeto Motoca na Praça. 

Criada com a premissa de vincular os alunos ao território e o bairro à escola, a ação é uma das finalistas da 6ª edição do Prêmio Territórios do Instituto Tomie Ohtake, realizado em parceria técnica com o Cidade Escola Aprendiz e o Centro de Referências em Educação Integral.

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Idealizadora do projeto, a professora Lívia Arruda explica que o Motoca na Praça nasceu da vontade de aproximar as crianças da praça e criar um vínculo positivo entre o território e a comunidade. “A EMEI é toda aberta, então, quem está na praça vê quem está dentro [da EMEI] e quem está dentro vê quem está na praça. Ao mesmo tempo, a escola era muito pouco vista pela comunidade”, explica a professora.

Motoca na praça “Por se tratar de uma praça extremamente urbana, com vulnerabilidade social e muitas pessoas em situação de rua, é um lugar não visto como ideal para brincar, né?”, reflete Livia, lembrando que a região era conhecida pelo risco de furtos e, por isso, marcada pelo medo e a desconfiança. “E a EMEI, de alguma forma, também tinha esse medo. Daí surgiu a ideia de se aproximar à praça, criar um vínculo positivo e também marcar presença, no sentido de transformar esse território”, ressalta a educadora.

O desejo de ocupar e humanizar a praça por meio de atividades que promovessem interação entre as cerca de 300 crianças com a região já se deu de diferentes formatos e propostas pedagógicas, seja com exposição do lado de fora da escola, contação de histórias, brincadeiras e outras atividades que antecederam o projeto Motocas na Praça.

“Percebemos o impacto positivo que essas ações traziam pra praça, envolvendo as crianças, o quanto brincar ali humanizava aquele espaço e fazia as pessoas pensarem sobre o direito à cidade, sobre o direito de brincar naquele ambiente. O local pode se transformar para acolher as crianças, em vez das crianças não ocuparem esses territórios”, conta Lívia.

Motocas na Praça: autonomia para brincar e explorar

Realizado inicialmente de forma esporádica, o Motoca na Praça ganhou notoriedade em meio à retomada das atividades após dois anos de pandemia. Assim, os alunos passaram a ocupar cada vez mais espaços pela região, estabelecendo vínculos através de exercícios de observação, pertencimento e fortalecimento do olhar para cada esquina, rua e cenário que se tornou objeto de estudo da atividade fora dos muros da escola.

“Temos muitas crianças filhas de imigrantes, principalmente da África e da América do Sul, além dos migrantes do Nordeste. Também é uma região que abriga ocupações ou moradias temporárias, então é um local de pouco pertencimento para essas famílias, não existe uma relação muito afetiva. Por isso é importante que as crianças se sintam pertencentes ao bairro, ao entorno”, reflete Lívia.

Para a arquiteta e urbanista Carol Tonetti, diretora do Núcleo do Núcleo de Cultura e Participação do Instituto Tomie Ohtake, e uma das selecionadoras do Prêmio Territórios, o projeto Motocas na Praça visibiliza os desafios que envolvem a presença das crianças nesses espaços. “O que o Motoca na Praça consegue fazer é quase uma intervenção artística”, define ela, analisando que, ao ocupar o espaço urbano, as pequenas motocas reivindicam um território democrático não apenas para elas, mas para todos.

Motoca na praça

“A beleza que é você ver um conjunto de crianças com a motoquinha chegando, expressada na força dessa coletividade. Eles de fato conseguem parar nosso cotidiano e mudar a perspectiva do nosso olhar”, destaca.

A urbanista observa que, embora a EMEI esteja localizada no centro da cidade, com uma rede de infraestrutura muito privilegiada, é preciso entender quem é a população que vive e frequenta a região. “Apesar de toda a infraestrutura consolidada, equipamentos públicos, museus estarem ali, eles parecem um tanto inacessíveis. Quando vejo as crianças passando naqueles espaços é nesse lugar que o projeto, para além do que ele proporciona para as crianças, têm um benefício enorme para a cidade e para a nossa coletividade como cidadãos do espaço urbano”, explica.

Diante do panorama de segregação urbana presente na capital paulista, a iniciativa acentua a importância da educação para além dos muros da escola. “O projeto expande a ideia de território educativo e implica a toda coletividade que usa o centro da cidade a entender que nós também somos responsáveis pelo cuidado e atenção dessas crianças”, defende Carol Tonetti.

Lívia, que há 11 anos leciona na EMEI, sublinha a contribuição do Motoca na Praça para a compreensão do brincar aliada ao exercício da autonomia, que permite às crianças experimentar a cidade, tornando-as sujeito ativo de seus direitos.

“Estar na motoca possibilita uma liberdade diferente, por conta das brincadeiras e passeios, a responsabilidade de gerir o brinquedo e todos os processos que envolvem a atividade. Para além de qualquer proposta pedagógica, a ideia é viver o território, sair para brincar, olhar, descobrir a vivência na cidade”, conclui a professora.

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