publicado dia 5 de dezembro de 2024
Como o Esporte Educacional pode apoiar os territórios educativos
Reportagem: Nataly Simões | Edição: Tory Helena
publicado dia 5 de dezembro de 2024
Reportagem: Nataly Simões | Edição: Tory Helena
🗒️Resumo: Com princípios como a inclusão e a cooperação, o Esporte Educacional é fundamental para a construção de uma sociedade saudável e plural, além de contribuir para o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e adultos. Apesar da relevância, o Esporte Educacional é historicamente pouco priorizado pelas políticas públicas e ainda luta por mais visibilidade. Saiba mais sobre o conceito e conheça iniciativas centradas no Esporte Educacional desenvolvidas no Brasil.
Praticar esportes é para todos e qualquer um. Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), qualquer pessoa não só pode como tem o direito de praticar esportes, noção detalhada pela organização na Carta Internacional da Educação Física, da Atividade Física e do Esporte, de 1978.
No Brasil, essa perspectiva foi fortalecida a partir da Constituição de 1988, que estabeleceu que o Esporte é um direito – além de ser dever do Estado fomentar práticas esportivas.
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A Carta Magna também destina recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional, também conhecido como Esporte Educacional.
Inclusão, participação, cooperação e corresponsabilidade
são princípios do
Esporte Educacional
Marcado pela ideia de “aprender jogando”, a modalidade objetiva o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes, adultos e idosos, além de princípios como inclusão, participação, cooperação e corresponsabilidade.
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Assim, experiências centradas no Esporte Educacional podem fortalecer a promoção de territórios educativos, que valorizem a prática esportiva e o lazer como um direito de todas as pessoas.
Além disso, o Esporte Educacional proporciona uma ocupação positiva dos espaços dos territórios, contribuindo para o sentimento de pertencimento e reconhecimento das potencialidades locais.
Embora seja fundamental para o acesso da população às práticas esportivas e ao lazer, o Esporte Educacional não conta com investimentos garantidos e, no geral, o Direito ao Esporte acaba ficando em segundo plano nas políticas públicas.
O Esporte na Constituição
“É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um” – Artigo 217 da Constituição Federal
Cacilda Amaral, professora de Ciências do Esporte da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), explica que, além de ser um direito, o Esporte é fundamental para a construção de uma sociedade saudável e plural.
“É importante que o Esporte, enquanto direito, não esteja apenas amparado na justificativa de direito constitucional, mas também enquanto necessidade para o desenvolvimento de uma sociedade saudável, plural e que tem oportunidade de manifestar nossa cultura também através da prática esportiva”, explica Cacilda, que é presidente da Associação Brasileira de Gestão do Esporte (Abragesp).
Manoel Tubino, uma das maiores referências no tema no Brasil, definiu o Esporte Educacional como uma modalidade que tem como fim proporcionar um significado educativo para a prática educativa, diferente do esporte de rendimento, que prioriza a performance.
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A professora Cacilda Amaral explica que o Esporte Educacional é aquele praticado no sistema formal e informal de ensino, evitando-se a seletividade e a hipercompetitividade entre os seus praticantes.
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“Ele tem como objetivo desenvolver de forma integral, física e intelectual os indivíduos, e sua formação para o exercício da cidadania e para a prática do lazer, visando uma integração social dos estudantes e a melhoria da qualidade de vida dos mesmos”, pontua.
“Temos o esporte praticado na escola como o principal exemplo do Esporte Educacional e as competições esportivas institucionalizadas organizadas pelas confederações nacionais e federações internacionais, um exemplo claro de esporte de alto rendimento”, acrescenta.
Sancionada em 2023, a Lei Geral do Esporte é considerada um marco recente do tema na legislação. Em resumo, ela traz como princípios fundamentais do Esporte a autonomia, a democratização, a descentralização, a diferenciação, a educação e a inclusão. Apesar do arcabouço legal, o Esporte Educacional enfrenta desafios significativos para avançar no país.
“O Esporte Educacional, historicamente, não é prioridade na agenda política”, analisa Cacilda Amaral, da UNICAMP
Na avaliação de Cacilda Amaral, as políticas públicas de esporte educacional seguem frágeis, mesmo com a destinação de recursos para o setor cristalizada na Constituição.
Além disso, a falta de financiamento e continuidade das políticas reflete a intermitência política e administrativa do Esporte no país.
Entre 2019 e 2022, por exemplo, a professora recorda que o Ministério do Esporte perdeu espaço e se tornou uma Secretaria Especial durante o governo de Jair Bolsonaro, com redução drástica no orçamento.
“O Esporte Educacional historicamente não é prioridade na agenda política. Foram destinadas verbas para a construção de centros esportivos em alguns municípios, porém a estrutura não basta para a promoção do Esporte, é necessário o desenvolvimento de programas, projetos e ações de longo prazo”, reforça Cacilda.
Outro desafio que o Esporte Educacional enfrenta no país é o seu reconhecimento como um direito. É o que avalia o Alexandre Arena, coordenador pedagógico do Instituto Esporte e Educação (IEE).
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“Nossa ideia é que o Esporte é um direito constitucional e que todos os territórios devem ter esse direito garantido. Aprendemos que só existe direito se houver reivindicação. Hoje, temos uma lei que precisa ser colocada em prática, mas para isso ela precisa ser reivindicada”, afirma Arena, explicando que o investimento no Esporte Educacional é também uma forma de promover vínculos entre o território e as comunidades.
Calcada nas premissas da Educação Integral, a Fundação Gol de Letra desenvolve iniciativas de Esporte Educacional há 26 anos. De lá para cá, quase 30 mil pessoas foram beneficiadas pelos seus projetos, realizados em dois territórios: na Vila Albertina, na periferia da Zona Norte de São Paulo (SP), e no bairro do Caju, no Rio de Janeiro (RJ).
Um dos projetos é o programa Jogo Aberto, cujo objetivo é contribuir para a cultura esportiva de crianças, adolescentes e jovens, por meio de práticas de Educação Integral, Esporte e Lazer. Nele, o público atendido acessa atividades de atletismo, capoeira, ginástica, handebol e judô, entre outras práticas esportivas.
“Também é possível oportunizar para as crianças, adolescentes e jovens a exploração da cidade e de espaços culturais e esportivos, com as atividades externas planejadas pela equipe”, conta a professora e psicóloga Cristiane Narciso, coordenadora de projetos da Fundação Gol de Letra.
Para Cristiane Narciso, da Fundação Gol de Letra, o Esporte Educacional pode promover a convivência democrática e o respeito às diferenças
Além das ações específicas no campo do Esporte, os projetos contam com uma equipe de Serviço Social, que trabalha em sintonia com a rede de proteção social dos territórios, visando o fortalecimento de vínculos entre as famílias atendidas e apoiar o desenvolvimento da comunidade local.
Para Cristiane, o Esporte Educacional oportuniza discussões e práticas que vão além da prática esportiva.
“O Esporte Educacional pode viabilizar a articulação do território ao redor dos temas mais sensíveis identificados pela comunidade, desde a proteção e garantia de direitos de crianças e adolescentes até questões de saúde pública, lazer e segurança. Também pode promover a convivência democrática e de respeito às diferenças”, defende.