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publicado dia 1 de fevereiro de 2022

Pobreza infantil pode ter relação com desenvolvimento de transtornos mentais, diz pesquisa

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Um grupo de 14 pesquisadores brasileiros publicou, em dezembro último, o estudo Childhood poverty and mental health disorders in early adulthood: evidence from a Brazilian cohort study (Pobreza infantil e transtornos de saúde mental no início da idade adulta: evidências de um estudo de coorte brasileiro, na tradução) na revista científica European Child & Adolescent Psychiatry. A pesquisa, que levou sete anos para ser concluída, apontou que pode haver uma relação entre a pobreza infantil e o desenvolvimento de transtornos mentais, como déficit de atenção e hiperatividade na juventude. O risco pode ser ainda maior para as mulheres.

Ao final do período, o trabalho concluiu que a pobreza, em todas as suas dimensões, e a exposição à situações estressantes, como mortes e conflitos familiares na infância, são alguns dos fatores de riscos evitáveis para o desencadeamento de transtornos mentais na idade adulta. Alguns dos elementos levados em consideração foram o nível educacional dos pais, as condições de moradia e infraestrutura das famílias e também o acesso a serviços básicos.

O trabalho acompanhou 1.590 alunos de escolas públicas de Porto Alegre (RS) e de São Paulo, que participaram de três etapas de avaliação; a última delas aconteceu entre 2018 e 2019. Esses estudantes integram uma grande pesquisa de base comunitária que, desde 2010, segue 2.511 famílias com crianças e jovens, à época com idades entre 6 e 10 anos, dentro do Estudo Brasileiro de Coorte de Alto Risco para Transtornos Psiquiátricos na Infância (BHRC).

Carolina Ziebold, uma das autoras da pesquisa, em entrevista a Luciana Constantino  (Agência FAPESP) destacou a importância do trabalho (até então inédito no país): havia uma suposição que relacionava a pobreza ao desenvolvimento de transtornos mentais: “Ainda não havia no Brasil uma pesquisa que permitisse analisar o desenvolvimento da criança até o começo da vida adulta baseado em avaliações psiquiátricas feitas em mais de um momento. Da forma como realizamos o trabalho, foi possível observar a tendência tanto na adolescência, como no início da idade adulta”.

“Crianças de famílias pobres chegaram a ter níveis de transtornos externalizantes menores do que as de não pobres no início do acompanhamento. Mas, depois de alguns anos, a curva se inverteu, com um crescimento constante dos distúrbios entre crianças de famílias pobres. A probabilidade de apresentar problemas entre elas foi de 63%, enquanto entre as de não pobres diminuiu no período”, completou a pesquisadora.

Mulheres sofrem mais

O artigo também chegou à conclusão de que fazendo a divisão por gênero, a questão da pobreza tem um impacto ainda maior para mulheres. Ziebold destacou que o resultado surpreendeu, uma vez que normalmente os transtornos são mais comuns em homens.

“Nossa hipótese é a de que as meninas pobres têm menos chance de diagnóstico precoce de problemas, seja na família ou na escola. Além disso, elas assumem mais tarefas desde cedo em casa, como cuidar de irmãos mais novos e de pessoas doentes. Essa sobrecarga provoca exposição a mais eventos estressantes, que aumentam as chances de apresentar problemas mentais quando adultas”, alertou.

Uma outra pesquisa do grupo apontou também que os transtornos são mais prejudiciais para mulheres nos resultados escolares. Pelo menos dez a cada cem meninas que estavam fora da série escolar adequada para sua idade poderiam ter acompanhado a turma se transtornos mentais, principalmente os externalizantes, fossem prevenidos ou tratados.

Por fim, a pesquisadora destacou que os impactos dos transtornos podem trazer consequências de longo prazo na saúde e nos resultados sociais durante a vida adulta e, por isso, as descobertas do estudo reforçam a urgência das intervenções antipobreza logo no início da vida.

“Quando falamos que é preciso reduzir a pobreza para diminuir as chances de transtorno mental, estamos pensando na questão de uma forma multidimensional. Não é uma solução rápida. Ações imediatas, como conceder bolsa e auxílio para que as famílias tenham renda, são importantes, mas também é necessário pensar em medidas mais amplas, que envolvam a promoção de habilidades socioemocionais, a redução do estresse, o acesso a serviços de educação e saúde, incluindo a mental”, finalizou.

Os 14 pesquisadores responsáveis pelo estudo foram: Carolina Ziebold, Sara Evans-Lacko, Mário César Rezende Andrade, Maurício Hoffmann, Laís Fonseca, Matheus Barbosa, Pedro Mario Pan, Euripedes Constantino Miguel Filho, Rodrigo Bressan, Luis Augusto Rohde, Giovanni Salum, Julia Schafer, Jair de Jesus Mari e Ary Gadelha.

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