publicado dia 13 de novembro de 2018
Natural Learning Initiative (USA) projeta espaços verdes para incentivar o brincar na natureza
Reportagem: Cecília Garcia
publicado dia 13 de novembro de 2018
Reportagem: Cecília Garcia
Quando pequeno, Robin C. Moore vivia em Sevenoaks, cidade inglesa cercada por uma grande área verde. Seu espaço de aprendizado se dava correndo e brincando nas matas próximas. Para o ainda futuro arquiteto, esses anos seriam determinantes na sua maneira de ver o desenvolvimento das crianças como somente possível se feito em uníssono com a natureza e o brincar livre.
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Com uma carreira dedicada à natureza como direito da infância, o caminho de Robin cruzou com o da psicoterapeuta Nilda Cosco, argentina nascida em Rosário, município referência em práticas em consonância com uma cidade educadora. Em 2000, os dois criaram o Natural Learning Initiative (NLI), organização especializada em projetar espaços ao livre e que funciona na NC State University, na Carolina do Norte (EUA).
Em sua 15ª edição, o Congresso Internacional de Cidades Educadoras reúne mais de 600 participantes das 485 cidades educadoras espalhadas ao redor do mundo. No Brasil, são 16: São Paulo (SP), Santo André (SP), Horizonte (CE), Belo Horizonte (MG), Sorocaba (SP), entre outras.
Trabalhando com escolas, museus, praças e espaços urbanos, o instituto se fundamenta em quatro pilares: a assistência para comunidades, design participativo de projetos, formação de profissionais na área de educação e arquitetura e pesquisa.
“O instituto possui uma dedicação ao humano e ao natural. Na parte do meio ambiente, ele se concentra no mundo natural em situações urbanas, pensando em como se pode melhorar a biodiversidade de espaços onde crianças e famílias passam a maior parte do seu dia. E aí que entra a parte humana: ao fazer isso, estamos expondo-as à beleza e ao entendimento do mundo natural, para que cresçam cidadãos que entendem a importância de cuidar do planeta para futuras gerações”, explica Robin.
As bem-sucedidas experiências em converter espaços vazios de intencionalidade pedagógica em oásis esverdeados do brincar é o motivo pelo qual Nilda e Robin foram convidados para serem oradores no XV Congresso Internacional de Cidades Educadoras. Sediado na cidade educadora de Cascais, em Portugal, o evento, que ocorrerá do dia 13 até o dia 16 de novembro, tem como tema “Cidade, Pertença das Pessoas: Caminhos para a coesão social na cidade”.
Richard Louv, autor do livro “A Última Criança da Natureza” e parceiro do NLI, declara em sua obra que “natureza e tempo são um binômio inseparável”. Para que crianças se desenvolvam de maneira saudável, é necessário, no entanto, de acordo com Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 12 m² de área verde. Em São Paulo, esse índice não passa de 2,6 m².
“No Brasil, nos Estados Unidos, o problema é sempre o mesmo: não somente a falta de espaço, mas a possibilidade de usá-lo. Seja um grande pátio ou um pedaço verde na rua, os ambientes externos têm o poder de atrair as crianças. Mas trabalhá-los é fazer com que elas se desconectem da cultura da tela”, explica Nilda, coordenadora de programas do NLI.
“No Brasil, nos Estados Unidos, o problema é sempre o mesmo: não somente a falta de espaço, mas a possibilidade de usá-lo”, diz Nilda Cosco
Um dos projetos que exemplifica a “naturalização de espaços”, como Nilda classifica o design operado pela NLI, são os pátios das escolas Montessori, na Carolina do Norte e em Nova York. Neles, foram concebidos os “ambientes preparados” (prepared environment), isto é, áreas facilitadoras da exploração e aprendizado com a natureza.
As mudanças demonstram como escolhas arquitetônicas e paisagísticas são decisivas para aproximar a criança da natureza: espaços fluidos e com divisões pouco aparentes entre natureza e arquitetura; caminhos curvos e ladeados de verde; áreas abertas onde possam acontecer aulas; atividades lúdicas ou simplesmente o brincar e o descanso; estruturas como casas de árvore e escorregadores conectados com a natureza, onde a fauna e flora locais revelam potencial pedagógico.
Nilda pontua que, mais do que a biodiversidade, o principal componente desses labirintos verdes é a participação dos agentes das comunidades, que escolhem e orientam os projetos. “O foco é no design participativo, para que as pessoas engajadas vejam valor no que estão fazendo e se apropriem disso. Crianças, parentes, doadores e escola trabalham juntos, participando de atividades como workshops de design.”
A defesa do brincar livre como aprendizado e sua associação com um desenvolvimento saudável são bandeiras defendidas pelo NLI. “Especialmente para as crianças pequenas, brincar é aprender. É um aprender não formal, ou como gostamos de chamar aqui, de ‘aprender tacitamente’ com as experiências. Crianças aprendem fazendo, olhando outras, explorando a natureza. É um grande desafio mostrar aos educadores que eles não precisam continuar instruindo tanto, e sim, deixar as crianças livres”, relata Robin.
Um dos projetos que será apresentado em Cascais e que reflete essa preocupação com o brincar para além do ato lúdico é o POD (Prevenindo Obesidade pelo Design). Aliando saúde, ocupação urbana e design, o instituto se alia com políticas públicas de Saúde para remodelar espaços ao ar livre, ajudando na prevenção da obesidade infantil nos Estados Unidos – que atinge quase 20% da população, segundo o CDC (Centers for Disease Control and Prevention).
Aumentar o espaço verde para as crianças como prática de prevenção à obesidade, segundo Robin e Nilda, aumenta o nível de atividade física das crianças, o tempo passado no lado externo, e também a proximidade com uma alimentação saudável, tornando-as atentas aos processos de crescimento de vegetais e frutas.
“Mais do que um projeto, o POD é uma estratégia que pode criar modelos de política pública não somente nos Estados Unidos, mas em outros espaços no mundo”, finaliza o arquiteto.