publicado dia 31 de janeiro de 2023
COIAB: rede de jovens indígenas repensa a comunicação como instrumento de luta por direitos
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 31 de janeiro de 2023
Reportagem: Ingrid Matuoka
Como mais uma forma para enfrentar o descaso e a negação de políticas públicas durante a pandemia nos territórios indígenas e onde vivem indígenas, surgiu a Rede de Jovens Comunicadores da COIAB, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, maior organização indígena regional do Brasil, que desde 1989 luta pelos direitos de povos indígenas.
Leia + A importância de ressignificar o 19 de abril nas escolas não indígenas
Durante a pandemia, o principal objetivo da rede de jovens indígenas era fazer chegar informações até as regiões mais afastadas a respeito da Covid-19 de forma segura – tanto enfrentando notícias falsas, quanto garantindo o distanciamento social.
Em 2021, o grupo lançou o podcast “Vozes Indígenas da Amazônia“, que aborda temas contemporâneos e denuncia a situação de vulnerabilidade dos povos indígenas em meio à pandemia, como a falta de medicamentos e alimentação, e uma animação sobre enfrentamento do coronavírus, “Grandes Guerreiros e Guerreiras”.
“A comunicação para nós não é um instrumento técnico, mas político, e esses jovens da Rede também são lideranças, são multiplicadores críticos, que refletem sobre representatividade, o papel das notícias, como fazer chegar em cada território e em qual linguagem”, relata Tarisson Nawa, uma das lideranças comunicadoras da COIAB, jornalista e mestrando em Antropologia Social na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A COIAB é composta por jovens de 18 a 30 anos, em todos os estados da Amazônia Brasileira, que antes de integrar o Jovens Comunicadores já eram reconhecidos por sua atuação na comunicação de organizações locais.
Eles foram então indicados para compor o grupo e realizar a integração entre a comunicação dessas diversas organizações indígenas que protagonizam suas lutas em seus territórios. Parte dos primeiros integrantes da Rede seguiu estruturando a equipe de comunicação, recrutando e formando novos comunicadores indígenas até chegar aos 80 jovens atuais.
“Nosso intuito é reunir esses jovens e mostrar que essa luta digital é importante. Nós fazemos formações para as redes sociais, mas também para as lideranças de base, para que a gente tenha pessoas estratégicas para denunciar violências nos territórios e lutar por direitos”, afirma Luene Karipuna, técnica de comunicação da COIAB, lembrando que a falta de acesso à internet é hoje o principal desafio do grupo.
Para além da pandemia, o grupo atua em demandas dos próprios territórios, na mediação da relação com os não-indígenas e na luta para garantir direitos. “A comunicação é uma ferramenta que a nossa população domina. Nosso papel é potencializá-la por meios técnicos, o que não faz de nós menos indígenas, mas valoriza e dá uma nova roupagem para práticas que já fazemos há séculos. Além disso, incentiva que mais indígenas ocupem a área da comunicação”, explica Tarisson.
Você sabe o que é lugar de fala? De acordo com a filósofa Djamila Ribeiro, não se trata de dizer quem pode ou não falar sobre algum assunto, mas colocar em perspectiva de onde parte um discurso, compreendendo a realidade racial, social, política, cultural, de gênero, entre outros, de quem fala. Essas características importam porque cada experiência de vida influi sobre os modos de compreender as facetas de uma mesma questão.
Isso é fundamental para promover uma representação adequada das 305 etnias indígenas brasileiras, muito diferentes entre si, e fazer frente à mídia tradicional, que pouco se ocupa do tema e, quando o faz, reforça estereótipos, pratica e renova o racismo.
“Quando falam em povos indígenas, falam em conflitos por terra. Mas lutamos por Educação, Saúde, Cultura, vários assuntos que a mídia tradicional ainda tem dificuldade de lidar. Então trazemos outras visões que superam o senso comum e mostramos que podemos nos comunicar como um não-indígena, mas fazendo da nossa forma: Não aceitamos que um não indígena fale sobre nós, nós falamos sobre nós mesmos. É uma forma de reconhecer a cidadania indígena e o direito à informação pelos próprios indígenas”, diz Tarisson.
Leia também