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publicado dia 2 de setembro de 2024

Criança de rua tem pressa: política para população infantil em situação de rua é criticada pela sociedade civil

Reportagem: | Edição: Larissa Alves

Resumo: Considerada um marco para a proteção dos direitos de crianças e adolescentes em situação de rua em São Paulo (SP), a Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua tem enfrentado desafios na hora de ser colocada em prática. Para organizações da sociedade civil, reivindicações como serviços de atendimento 24 horas e programas de transferência de renda ficaram de fora da política pública, regulamentada pelo decreto 63.439 em maio de 2024. 

Movimentos em defesa dos direitos de crianças e adolescentes em situação de rua e parlamentares buscam a revisão do decreto que regulamentou a Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua em São Paulo (SP). 

Publicado em maio de 2024, o decreto 63.439/2024 deixou de incluir solicitações como serviços de atendimento 24h, política de acolhimento para um convívio saudável, e programa de transferência de renda para combater o trabalho infantil.

O tema foi debatido no seminário “Criança de Rua Tem Pressa – Decreto 63.439/2024”, ocorrido em 28/08 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Leia + 4 pontos sobre as crianças em situação de rua no Brasil

“Nosso objetivo é a implementação de fato da lei 17.923, de 2023, porque entendemos que o decreto publicado recentemente não dá conta de uma política de atendimento às crianças e adolescentes que estão trabalhando ou vivendo nas ruas de São Paulo”, apontou Miriam Tronnolone, representante do movimento “Criança de Rua Tem Pressa”.

Em articulação com 30 organizações, o movimento dialoga com o poder público municipal sobre a política desde 2015. Em encontros semanais e mensais, o Criança de Rua Tem Pressa tem defendido medidas para a proteção de crianças e adolescentes, ancoradas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

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A sanção do Projeto de Lei 17.923 em abril de 2023 pelo prefeito Ricardo Nunes, foi vista como uma vitória para os movimentos em defesa das crianças e adolescentes que vivem nas ruas. No entanto,  o decreto que regulamenta a legislação, publicado pouco mais de um ano depois, em maio de 2024, foi como um banho de água fria.

“Para a nossa surpresa, itens importantes foram excluídos do decreto. A gente precisa continuar na luta porque, de certa forma, passamos por uma enganação. A cada lei, a cada decreto, são excluídos serviços para garantir efetivamente os direitos de crianças e adolescentes”, explica Miriam.

Além da visibilidade do seminário, um abaixo-assinado pela revisão do decreto já conta com o apoio de mais de 27 mil pessoas na Internet.

Crianças e adolescentes em situação de rua em SP

Um reflexo da desigualdade, 53 mil pessoas vivem em situação de rua na cidade mais rica do país, de acordo com informações do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico).

As crianças e adolescentes em situação de rua são cada vez mais visíveis para os demais moradores de São Paulo (SP): 34% relataram terem visto a cena em 2023, ante a taxa de 28% registrada na pesquisa anterior.

O retrato é da pesquisa Viver em São Paulo: Pobreza e Renda, levantamento periódico feito pela Rede Nossa São Paulo, programa do Instituto Cidades Sustentáveis.

O que ficou de fora do decreto?

A legislação reconhece a rua como espaço de violação de direitos e de risco extremo para crianças e adolescentes, além de prever assistência e acolhimento para esse público. Na contramão do que foi proposto pelos movimentos sociais, porém, o decreto 63.439 não especifica de que forma funcionarão esses serviços.

Além disso, ficaram de fora reivindicações dos movimentos sociais como a ampliação dos horários de atendimento a crianças e adolescentes (serviços 24h), a instituição da chamada “Bolsa de Convivência” e a criação de um programa de transferência de renda com o objetivo de combater o trabalho infantil.

“O decreto foi feito totalmente destoado da legislação e isso por si só já ilegal. A legislação foi pensada em cima de um buraco existente no atendimento à população em situação de rua. Esse decreto não contribui para a efetivação da política e ignora pontos importantes como a construção de serviços de acolhimento que promovem a integralidade e as especificidades necessárias para o convívio saudável e retirou a integração dos serviços especializados de abordagem social dos centros de referência com atuação voltada às famílias e a instituição de bolsas para o afastamento do trabalho infantil. A prefeitura precisa enxergar esse projeto”, defendeu a deputada federal Juliana Cardoso (PT-SP), durante o seminário “Criança de Rua Tem Pressa”. A parlamentar foi vereadora da capital paulista por quatro mandatos e foi uma das autoras do projeto de lei da Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua.

Imagem mostra um menino negro segurando uma cesta com doces para vender. Ele anda em meio a carros no trânsito.

Prefeitura de São Paulo reconhece falha

Já entre as ações previstas no decreto, está a criação de um Núcleo Técnico de Crianças e Adolescentes em Situação de Rua, composto por nove secretarias, incluindo Educação e Saúde. Segundo a representante da Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos, Luciana Braga, o objetivo do núcleo é trabalhar com temas como a política de recâmbio, voltada à análise da situação de crianças e adolescentes de outras cidades que chegam em São Paulo em busca de trabalho. 

“Não podemos pegar essas crianças de outros municípios e devolvê-las a seus algozes. É necessário apurar e investigar suas condições sociais”, explicou, durante o seminário. Mas a representante do governo municipal reconheceu que o decreto deixou iniciativas importantes de fora.

“Tivemos a publicação de um decreto que não teve nenhuma ampliação da política de assistência, mas apostar somente nos serviços de assistência não é a solução”. Questionada, Luciana Braga também falou sobre as possibilidades reais do decreto ser revisto para atender às reivindicações dos movimentos sociais e disse depender do orçamento para o próximo ano.

“Eu acredito que para fazer a revisão completa do decreto precisamos ter a previsão orçamentária aprovada para 2025 dentro da política de assistência. Se isso for sanado, a gente pode rever e trazer esses serviços especializados para dentro do decreto”, concluiu.

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