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publicado dia 28 de abril de 2022

No Norte do Brasil, movimentos sociais se articulam para reverter impactos da pandemia

Reportagem:

Do luto à luta, o Brasil tenta se reerguer em meio às centenas de milhares de vidas perdidas durante a pandemia do coronavírus. Frente a um cenário marcado pelo colapso econômico, desemprego e encarecimento de itens básicos, como arroz e feijão, milhões de famílias brasileiras sobrevivem a uma rotina de moedas contadas. 

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É o que mostra o relatório divulgado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL): entre 2020 e 2021, o número de pessoas em situação de extrema pobreza aumentou em quase cinco milhões na região.

As consequências da pandemia são ainda piores para as localidades mais vulneráveis. Enquanto alguns estados apresentam movimento de retomada da produtividade, no Norte do país a atividade econômica ainda enfrenta retração de 0,12%, cenário inferior ao vivido antes da chegada da Covid-19, conforme constatado pelo estudo do Banco Central.

Nos últimos dois anos, o contexto pandêmico aventa desafios complexos para as políticas públicas sociais, sobretudo no que diz respeito à atuação de movimentos e coletivos com ações nos estados do Pará (PA)  e Amazonas (AM).

Em uma análise sobre a situação de emergência social vivida nestes territórios, Cleice Maciel, coordenadora de atividades sociopedagógicas do Movimento República de Emaús, organização não governamental paraense que atua na promoção e defesa de direitos de crianças e adolescentes, chama a atenção para os impactos da pandemia no convívio familiar, comunitário e, especialmente, na sobrevivência das populações mais vulneráveis em Belém (PA). “Muitas famílias que têm como fonte de renda trabalhos domésticos e autônomos, em sua maioria chefiadas por mulheres, foram drasticamente afetadas financeiramente”, pontua.

O Movimento República de Emaús atende principalmente residentes do Bengui, bairro periférico da capital do estado paraense, com população de aproximadamente 29 mil pessoas. Surgido na década de 1940, em um processo de ocupação coletiva de moradias de baixa renda, o bairro tem como característica econômica pequenos comércios. “Os mais atingidos pela pandemia são mulheres negras moradoras de periferia, mães solos, domésticas, diaristas que ficaram sem renda”, afirma Cleise. 

O cenário da tragédia social causada pela pandemia não é diferente na maior cidade da região, Manaus (AM), com mais de 2,2 milhões de moradores. Em dezembro, números divulgados pela Síntese de Indicadores Sociais, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que em 2020 mais de 505 mil pessoas encontravam-se em situação de extrema pobreza no Amazonas, vivendo com menos de R$ 155 por mês.

Meses após início da retomada das atividades e flexibilizações, hoje a capital manauara vive uma conjuntura de tímida recuperação econômica e aumento dos preços no mercado.

A principal fonte de renda da cidade depende exclusivamente da Zona Franca de Manaus e, segundo a historiadora, professora e militante do movimento negro, Kevlyn Jéssica, é perceptível a crescente adesão à informalidade pelos trabalhadores nos dias atuais.“Hoje a população amazônica tenta se reerguer da forma que pode. O sucateamento da ZFM (Zona Franca de Manaus) durante a pandemia desligou diversas empresas e provocou demissão em massa”, diz.

Pesquisas recentes mostram que a taxa de informalidade chegou a 59,5% da população amazonense, segunda maior taxa do país, menor apenas do que a do Pará. Dessa forma, quase 6 a cada 10 trabalhadores não possuíam vínculo empregatício formal em 2022.

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À luta

Diante da crise socioeconômica pós-pandemia, Cleice explica que a demanda por serviços socioassistenciais cresceu para proteger famílias, crianças e adolescentes em Belém. 

Com atuação na promoção e defesa dos direitos humanos de crianças, a organização tem como objetivo garantir ações que retirem meninos e meninas da situação de exclusão social e violência nas comunidades periféricas.  

Exemplo disso é o programa República do Pequeno Vendedor, que oferece   atividades de profissionalização a adolescentes e jovens entre 14 e 24 anos, com estímulo à geração de renda na perspectiva da economia solidária (Produção e comercialização de biojoias em cerâmica, plantação e comercialização de hortaliças, mudas frutíferas e ornamentais, cursos de cabeleireiro e designer de unhas) com as famílias, especialmente as mulheres arrimo de família.   

Como em outras grandes capitais do país, é nos extremos da cidade de Manaus em que a tangente da pobreza explicita as consequências dos últimos dois anos de pandemia. “A Zona Leste de Manaus comporta a população mais pobre da cidade, portanto é lá que vamos nos deparar com crianças desnutridas, com falta de apoio médico e pessoas em situação de trabalhos escassos”, avalia.

Desafios que, na ausência do poder público, exigem mobilização por parte dos movimentos sociais nestes territórios, seja através da distribuição de alimentos, absorventes e produtos de higiene básica nos bairros mais pobres. “Vejo os coletivos tomando a posição de união e se juntando para fornecer informações, seja através de panfleto ou através de rodas de conversas e ações feitas em bairros”, afirma.

Em 2021, a campanha Amazonas Pela Vida, idealizada por movimentos sociais e coletivos do estado, promoveu a doação de itens básicos e de saúde para grupos de pessoas em situação de vulnerabilidade.

A ação teve como prioridade comunidades periféricas, povos indígenas, comunidades quilombolas, pessoas que vivem com HIV, grupos de mães, pessoas LGBT, trabalhadoras e trabalhadores do sexo e outros grupos mais atingidos pelo colapso social. 

A seis meses das eleições gerais, Cleice reforça a importância de uma atuação política permanente, que crie diálogos e incentive a participação popular.  “Nossas expectativas em relação aos próximos anos é de mudança, retomada das pautas sobre a restituição de direitos, e fortalecimento das entidades da sociedade civil, que vêm sendo marginalizadas.” 

Desde a retomada das atividades, a instituição deu início a ciclos de rodas de conversa com os adolescentes de bairros periféricos, com pautas sobre a relevância da participação ativa da juventude no processo eleitoral brasileiro. Além disso, um projeto voltado ao empoderamento feminino prevê a participação da mulher na elaboração e implementação de políticas públicas para as mulheres na capital paraense.

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