publicado dia 18 de março de 2022
Livro reúne histórias e reflexões sobre cidade, gênero e infância
Reportagem: reginacintra
publicado dia 18 de março de 2022
Reportagem: reginacintra
O livro “Cidade, gênero e infância”, lançado recentemente pela editora Romano Guerra, nasceu de um concurso realizado pela Fundação Bernard van Leer, em 2016, o Urban 95 Challenge. Respondendo à pergunta disparadora – “Se você pudesse vivenciar uma cidade a uma altura de 95 cm (altura média de uma criança saudável de três anos), o que você faria de diferente?” – foi feita proposta para a inclusão da temática da primeira infância nos cursos de graduação e pós graduação da Universidade Mackenzie e a formação de um núcleo de pesquisa específico para o tema (iniciado no ano seguinte). O projeto esteve entre os 26 selecionados ao redor do mundo.
A provocação para um olhar para o desenvolvimento e uso de cidades que considere todas as faixas etárias em suas organizações espaciais, oferecimento de serviços, entre outros aspectos, com especial atenção às crianças, foi ao encontro do trabalho de Rodrigo Mindlin Loeb (também professor do Mackenzie) no seu fazer urbanístico: o zelo pelo desenvolvimento saudável, especialmente para a população mais nova.
O livro, que pretende se tornar uma referência na formação de arquitetos, urbanistas, gestores públicos e profissionais de outras áreas do conhecimento que olham para a cidade e a valorizam como um ambiente educativo e formativo, reúne 22 artigos. No texto de abertura, fala-se na intenção dessa formação também para quem trabalha em “territórios urbanos vulneráveis com o objetivo de criar melhores condições no espaço construído e promover melhores possibilidades de desenvolvimento e empoderamento para as mulheres e as crianças”. O arquiteto conta que, ao planejar o livro, almejou que “ele tivesse consistência para poder servir”.
Loeb afirmou, em entrevista, que há diversas experiências interessantes acontecendo pelo Brasil e que a pauta não é exatamente uma novidade. Relembra os parques infantis criados por Mario de Andrade, quando esteve à frente do Departamento de Cultura (que se transformaria na Secretaria Municipal de Cultural), entre 1935 e 1938: aqueles espaços verdes e abertos recebiam crianças a partir dos 3 anos, ofereciam diversas atividades complementares à educação formal, como esporte, canto, aulas de desenhos e acolhiam com muita atenção os filhos da classe operária, sendo muitos deles imigrantes.
‘Cidade, gênero e infância’ busca reunir e sistematizar experiências. “É preciso mudar a perspectiva do olhar para a cidade e vê-la como um todo integrado. A gente acaba atuando mais diretamente no enfrentamento das problemáticas de maneira isolada”. A inclusão da disciplina na graduação e pós graduação de uma universidade também é um caminho de sensibilização e um despertar para a questão da intervenção e cuidado em espaços vulneráveis.
Loeb pontua ainda que há realidades “absolutamente inaceitáveis”, desiguais e que todos devem se envolver na resolução, como as pessoas afetadas pelos problemas. Para ele, é a composição de cinco esferas que deve atuar em conjunto: comunidade, poder público, iniciativa privada, sociedade civil e universidade. “Não é uma só solução, são muitos mundos e estratégias possíveis”.
E então, olhando para os problemas concretos e a necessidade de que as soluções atravessem diferentes olhares, incluindo quem os enfrenta, o urbanista traz também a questão do gênero como “indissociável” da temática cidade. O livro traz o altíssimo percentual de mulheres cuidando de crianças mais novas: é o sexo feminino em 85% dos casos. Por isso, em capítulo específico, argumenta: “Historicamente, as mulheres vêm contribuindo, de modo consistente, para a melhoria da qualidade de vida em seus lares, comunidades e cidades. Entretanto, elas não são adequadamente reconhecidas no planejamento e promoção de políticas públicas. Como resultado, a análise e as ações projetadas para as cidades, serviços, equipamentos e infraestrutura falham ao não incluir as demandas e necessidades específicas das mulheres”.
Abrindo o livro
Ao lado da também arquiteta e urbanista Ana Gabriela Godinho Lima, Rodrigo Mindlin Loeb organizou as 456 páginas da publicação em três partes: ‘O Território e a Criança’, ‘O Brincar e o Espaço Público’ e ‘A Transformação da Comunidade’, além de prefácios antecedendo os textos e um ensaio fotográfico.
Estão reunidas histórias e pesquisas trazidas por organizações como a Avante, Cecip e Instituto Elos. Os temas conversam entre si e se complementam com olhares para experiências exitosas e também o relato de violência e segregação em determinados territórios. Alguns dos artigos são: “O direito de sonhar” (Tião Rocha e Vera Lion), “Percursos da primeira infância: mobilidade e espaços públicos” (Ursula Troncoso), “Barreiras urbanas, segregação territorial e vulnerabilidade social” (Daniela Getlinger e Julio Luiz Vieira), “Brincadeiras no quarteirão” (Juliana de Cesare Marques e Maria de Fatima Aranha), além de ’”Mulheres Caminhantes” (Alice Junqueira, Ana Carolina Nunes e Leticia Sabino).
Natacha Costa, diretora executiva da Cidade Escola Aprendiz, assina o prefácio do livro (“Crianças, Cidade e Educação”), que conta com outras três convidadas: Claudia Vidigal, Adriana Friedmann e Ana Beatriz Goulart de Faria; Vital Didonet complementa a seção.
“Cidade, Gênero e Infância” pode ser adquirido em livrarias físicas ou pelo site da editora.