publicado dia 11 de abril de 2025
Acampamento Terra Livre (ATL): 3 reivindicações dos povos indígenas
Reportagem: Nataly Simões | Edição: Tory Helena
publicado dia 11 de abril de 2025
Reportagem: Nataly Simões | Edição: Tory Helena
Resumo: A 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília, reuniu ao menos 7 mil indígenas para reivindicar a garantia de direitos fundamentais. Ao longo de uma semana, o movimento indígena se reuniu com autoridades e discutiu temas fundamentais para o futuro das mais de 135 etnias existentes no país. Confira as principais reivindicações.
Em Brasília (DF), o Acampamento Terra Livre (ATL) reuniu, entre os dias 7 e 11 de abril, aproximadamente 7 mil indígenas de ao menos 135 etnias de diferentes territórios do Brasil em mobilização pela garantia de direitos previstos na Constituição Federal.
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Realizado tradicionalmente no Abril Indígena, o ato é considerado uma das maiores demonstrações de força política do movimento indígena. Nos cinco dias de mobilização, sintetizada no tema “APIB somos todos nós: em defesa da Constituição e da vida”, os manifestantes realizaram uma série de ações, incluindo o lançamento de uma comissão internacional indígena focada na participação na Conferência das Partes (COP-30), que ocorrerá em novembro em Belém (PA).
Sessão de homenagem na Câmara dos Deputados
Ainda no início da semana, na terça-feira (8 de abril), a Câmara dos Deputados sediou uma sessão em homenagem à 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL). Proposta pela deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG), a iniciativa contou com a presença de lideranças do movimento indígena, que reforçaram a importância dos direitos previstos na Constituição serem garantidos, e ministros de Estado.
Entre eles, Sônia Guajajara, dos Povos Indígenas, e Macaé Evaristo, dos Direitos Humanos e Cidadania, além da presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, e do secretário de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Ricardo Weibe Tapeba.
“Este é o Congresso Nacional que sonhamos para o futuro. O Congresso de um Brasil que começa conosco, os primeiros brasileiros, e que, no entanto, somos o último a chegar ao Congresso Nacional”, afirmou a deputada Célia Xakriabá, que presidiu a sessão.
A sessão também celebrou o aniversário de 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), atual organizadora do acampamento e que foi criada em 2005, no segundo ato nacional.
Ao longo da semana de mobilização, foi realizado mutirão, pelo Centro Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen Brasil), para inclusão do nome da etnia no registro civil. A ação ocorreu na concentração do ATL, no Complexo Funarte.
Repressão durante marcha
Já na noite da quinta-feira (10), durante a tradicional marcha para a Esplanada dos Ministérios os manifestantes foram recebidos no gramado do Congresso Nacional com bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo em uma ação do Departamento da Polícia Legislativa (DEPOL) e da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). Com a repressão, muitos indígenas precisaram de atendimento médico.
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O Senado alegou ter sido surpreendido com o que chamou de “avanço inesperado” dos indígenas em direção ao Congresso, mas o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontou que os manifestantes não representavam riscos e se dirigiram ao gramado iniciando cantos, rituais e rezas.
A APIB, por sua vez, repudiou os ataques e classificou como “desnecessário” o uso de armas químicas contra os manifestantes, mulheres, idosos e crianças.
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Confira, a seguir, três das principais reivindicações dos povos indígenas durante o Acampamento Terra Livre (ATL) em 2025.
Marco Temporal
No centro da mobilização dos povos indígenas está a Lei N° 14.701/2023, conhecida como Marco Temporal e que defende que esse grupo populacional tem direito apenas às terras ocupadas em 1988, quando a Constituição foi promulgada.
De acordo com a Cimi, a lei trata-se de um conjunto de ataques contra os direitos constitucionais dos povos indígenas. A legislação abre as terras indígenas já demarcadas para a exploração predatória e a devastação ambiental, além de dificultar novas demarcações.
O Supremo Tribunal Federal (STF) apontou em 2023 que o Marco Temporal é inconstitucional, porém a lei continua vigente e segue em discussão na corte. O ministro Gilmar Mendes, relator do caso no STF, criou uma Comissão Especial de Conciliação, da qual organizações como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se opõem por considerá-la “forçada” e com potencial de acarretar em consequências ainda mais graves para os indígenas.
No terceiro dia do ATL, durante as discussões da plenária “O Acordo sem Voz: A Câmara de Conciliação no STF e a Reconfiguração da Política Indigenista no Brasil”, o movimento indígena trouxe à tona a minuta de uma reivindicação ruralista por “terra nua”, considerada uma das principais ameaças atuais aos direitos dessa população.
“O direito ao território é originário, anterior à própria Constituição. Não podemos abrir mão de um direito que conquistamos com muita luta. Indenização por terra nua é algo que, se a gente permitir, será mais uma das muitas desculpas utilizadas para não se demarcar terras indígenas”, apontou o advogado da APIB Guila Xukuru.
COP30 e participação nos debates sobre crise climática
Durante o ATL, um documento que reúne metas climáticas foi apresentado na plenária “A Resposta Somos Nós: Povos Indígenas rumo à COP-30”.
O NDC (sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada) foi elaborado a partir de propostas feitas por indígenas de diferentes regiões e reforça que o debate climático precisa considerar a equidade, a autodeterminação e a participação efetiva dos povos indígenas e comunidades tradicionais na implementação da NDC brasileira, no âmbito do Acordo de Paris.
O documento é dividido em seis eixos temáticos: mitigação, adaptação, financiamento, transferência de tecnologia, capacitação, justiça e ambição, e co-benefício.
Em síntese, os indígenas reivindicam que a proteção dos direitos territoriais dos povos deve ser encarada como uma política essencial de mitigação climática, considerando a importância de proteção dos saberes ancestrais como a medicina indígena e o manejo do fogo.
Nessa ideia também deve ser levado em conta o financiamento para propor revisões dos mecanismos existentes, integração dos conhecimentos tradicionais à ciência moderna, formação técnica e acesso a informações climáticas em linguagem acessível, assim como o reconhecimento da dívida histórica com os povos tradicionais.
Direito à Educação
O Direito à Educação com respeito à diversidade cultural também esteve entre as reivindicações. O tema apareceu em faixas sobre políticas públicas ao longo do Acampamento Terra Livre (ATL) e os pedidos do movimento indígena abrangem vários eixos.
Um deles é o reconhecimento e o apoio efetivo à Educação Escolar Indígena em todos os níveis e o cumprimento das responsabilidades dos estados e da União, conforme determina a LDB.
Outra reivindicação diz respeito à garantia do acesso de todos os indígenas à Educação de qualidade da Educação Infantil até o Ensino Superior, de forma continuada e permanente, nas aldeias e nas proximidades.
Assegurar condições de igualdade na disputa dos indígenas por vagas nas universidades e criar pré-vestibulares específicos para essa população, bem como garantir o ensino científico integrado com o conhecimento tradicional para os estudantes indígenas também constam entre as reivindicações.