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publicado dia 21 de março de 2014

Vai no Bixiga pra ver

Roda de samba no Bixiga | Crédito: fore

O Bixiga, um dos bairros mais antigos e tradicionais de São Paulo, tinha em 2010 cerca de mil imóveis tombados e outros três mil em processo de tombamento. Nos últimos anos, entretanto, a região vem sendo palco de um processo de deterioração dos espaços públicos que não condiz com sua história rica e marcante.

Na última quarta-feira, 19/3, a Casa Mário de Andrade realizou o Ciclo de Debate Paixão por São Paulo, em parceria com o HeySP. O patrimônio histórico material e, principalmente, imaterial do Bixiga foram discutidos no encontro que, curiosamente, aconteceu na primeira sede do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) de São Paulo, situado à rua Lopes Chaves, 546, na Barra Funda.

Para frear esse processo, alguns cidadãos resgataram o sentimento de união que sempre existiu por ali e lançaram um projeto para o futuro do Bixiga: o Plano de Bairro Bela Vista 2020, documento escrito de modo participativo que propõe uma série de melhorias a serem realizadas até a próxima década.

“Aqui sempre aconteceram muitos projetos, mas havia pouca articulação entre eles. Estamos propondo um dos primeiros planos de bairro comunitários da cidade”, explica Maria Paula Yoshinara, moradora da região e integrante da Área de Desenvolvimento Social do Senac. “Através do diagnóstico participativo, pretendemos mostrar como os problemas do bairro podem ser resolvidos dentro do próprio bairro.”

Maria Paula é filha de Armandinho do Bixiga, um dos moradores mais conhecidos da região. Além de fundar o Museu de Memória do Bixiga, foi ele quem teve a ideia de fazer um bolo especial para o aniversário de São Paulo: feito por inúmeras cozinheiras que viviam ali, tinha um metro para cada ano da cidade e, de tão grande, entrou para o Guiness Book, o livro dos recordes. “Começou como brincadeira, mas as pessoas se interessaram pela festa comunitária e, por muito tempo, ficou viva essa relação entre bairro e cidade. É muito importante estar com seu vizinho ocupando a rua”, relata Maria Paula.

O origem do nome “Bixiga” tem várias versões. Uma delas atribui à Chácara do Bexiga, um terreno que, por volta de 1820, pertencia a Antônio José Leite Braga. A história diz que ele possuía cicatrizes de varíola, doença popularmente conhecida como “Bexiga”. Uma outra versão relata que a Chácara recebia portadores da doença, por isso teria ficado conhecida pela alcunha. Anos mais tarde, a grafia teria sido modificada para evitar associações negativas.

Mapeamento artístico

O fotógrafo André Douek, idealizador da Jornada Fotográfica, nasceu no Cairo, capital do Egito, e se instalou no Bixiga quando chegou ao Brasil. Ele lembra que, na década de 60, a construção do elevado que atravessa a Praça 14 Bis deteriorou muito a região. “As calçadas ficaram menores, os jardins foram destruídos, a poluição visual e sonora aumentou. Sem dúvida, a qualidade de vida do Bixiga piorou nesse período”, avalia Douek.

Quem também tem lembranças da adolescência no Bixiga é Rose Satiko, vice-diretora do Centro de Preservação Cultural (CPC) da Casa de Dona Yayá, localizada no bairro. “Era o polo de encontro para os interessados na cultura efervescente da cidade. Muitas vezes eu vinha de Santo André só para ir aos teatros do Bixiga”, lembra a antropóloga.

Em 2013, o CPC realizou o projeto Bixiga em artes e ofícios: percursos audiovisuais, que fez um mapeamento virtual das inúmeras atividades artísticas que acontecem no bairro, com a intenção de preservar a produção humana que acontece ali. “Queríamos olhar para o Bixiga a partir do trabalho de seus artistas e artesãos”, explica Rose. Ela crê na importância do mapa como instrumento que aproxima o conhecimento produzido na universidade e o conhecimento comunitário.

No mapa, construído de maneira colaborativa – “a partir daqueles que usufruem seus espaços” –, o trabalho de sapateiros, relojoeiros, cozinheiros e marceneiros são valorizados e reconhecidos como patrimônio imaterial do Bixiga.

Travessa dos Arquitetos, no Bixiga | Crédito: Augusto Gomes

Miscigenação

Paulo Santiago, da Associação Novolhar, localizada no Bixiga, aponta que a miscigenação existente na região foi essencial para a formação do bairro. “Aqui se misturaram italianos, negros, portugueses e nordestinos”, afirma, recordando-se da missa afro que acontece aos domingos em plena Igreja Nossa Senhora Achiropita. “A convivência entre culturas diferentes sempre foi muito forte.”

“Todo mundo olha e diz que o Bixiga está decadente. Mas estaria muito pior se não houvesse todo um movimento para resgatar e deixar o bairro vivo”, observa Santiago. Para Maria Paula, a ideia da governança local ainda é muito presente nas ruas da Bela Vista, e é preciso fomentar a integração que contribua para que as pessoas se conheçam, dialoguem e proponham inovações. “A sensação de segurança dos moradores voltou a crescer quando eles passaram a se conhecer”, relata.

Atualmente, o Bixiga possui 67 mil moradores e 11% das moradias da região são cortiços. “Precisamos promover uma recuperação que seja independente do poder público. Isso tem tudo pra dar certo se a comunidade se mantiver unida”, analisa Santiago. “Não adianta apenas recuperar as calçadas, pois isso não integra as pessoas.”

Assista aqui um vídeo sobre o Plano de Bairro Bela Vista 2020:

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