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publicado dia 14 de março de 2014

Democracia na internet: entenda o que está em jogo com a votação do Marco Civil

Manifestação na Câmara, em Brasília, pede aprovação do Marco Civil da Internet.

A história da internet é uma história de liberdade e conflito. Enquanto seu embrião foi forjado no ambiente militar americano, preocupado com a transmissão de informações durante a Guerra Fria, seu desenvolvimento se deu em um ambiente de contra cultura e liberdade, em câmpus universitários e garagens de jovens ativistas dos EUA, desejosos de uma auto-estrada de transmissão de informação.

Entre batalhas e acertos com governos, estados e empresas, essa utopia foi um projeto vencedor e a internet é uma experiência cultural revolucionária e, na medida do possível, democrática. Qualquer um pode produzir, ler, acessar e compartilhar conteúdos antes inacessíveis. Com software livre, plataformas diversas, construímos uma maravilha, uma biblioteca de babel e um processo continuamente colaborativo, caótico e organizado ao mesmo tempo.

A rede, no entanto, continua sendo um projeto em disputa. Neste contexto, surge em 2009 a ideia do Marco Civil da Internet Brasileira, hoje um projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional. É uma ferramenta para tentar garantir que a internet mantenha sua essência: ser livre.

Entre as maiores virtudes do projeto, está a forma de sua construção, ocorrida entre 2009 e 2010 em seu habitat natural, a rede, e por seus habitantes naturais, os internautas, em parceria com o governo, da forma mais consensual possível. Apontado como uma das mais avançadas legislações do mundo sobre a internet, ela versa sobre a proteção aos dados de usuários, neutralidade da rede e liberdade de expressão.

Entenda o que é e o que está em jogo com a votação do Marco Civil.

Liberté, igualité, neutralité!

Em todas as revoluções, diversos princípios foram criados para dar consequência aos novos tempos. Durante a revolução francesa, por exemplo, surgiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que serviu para basear a construção da sociedade pós-absolutista. Com a internet não é diferente. Não à toa, o Marco Civil já foi chamado de “A Constituição da Internet”, em referência ao processo constituinte que levou a elaboração da carta magna do Brasil, a Constituição Federal de 1988. Mas há ainda alguns pontos, direitos garantidos pelo Marco, que estão sob ameaça.

Um deles é a questão da liberdade de expressão. Sem uma legislação específica para mediar conflitos, hoje qualquer imagem, texto ou vídeo pode ser retirado com um telefonema, sob o medo daquele que veicula o conteúdo produzido seja processado por quem se sentiu lesado. Nesse processo, inexiste o direito de defesa. Isso gera um processo de “censura automática”, ou seja, basta alguém se sentir lesado e denunciar para que o conteúdo suma.

É evidente que é necessário analisar o que é publicado e que, muitas vezes, pode realmente incorrer em difamação ou calúnia, mas atualmente não há quem decida isso. O marco civil, ao desresponsabilizar os sites sobre os conteúdos gerados por terceiros, diminui a insegurança jurídica sobre o assunto e cria mecanismos que garantam um julgamento justo.

Outro ponto que tem gerado disputa no PL 5403/2011 é a questão da neutralidade da rede. Mas o que é neutralidade? É a garantia que os provedores de banda larga, as empresas de telecomunicações em geral, têm que garantir a igualdade entre todos os conteúdos, ou pacote de dados, na sua velocidade de tráfego. Dessa forma, uma empresa não pode privilegiar certas informações, propagandas ou dados em detrimento de outros. Isso é fundamental para garantir uma internet democrática, como explica Pedro Ekman, do Coletivo Intervozes, em artigo publicado pela Carta Capital.

“Ter uma rede neutra é definir que o dono da estrada não pode definir que veículos podem andar mais rápidos e quais tem que enfrentar um congestionamento. Se nossas estradas não fossem neutras em relação a quem viaja por elas, existiriam uma larga pista para quem pagasse mais e um pista estrita para quem não tivesse dinheiro. Ou ainda a administradora da estrada poderia definir, em um acordo comercial com montadoras, que algumas marcas de automóveis passam sem pagar pedágio, enquanto as outras são obrigadas a pagar. Como não existem leis obrigando a neutralidade na rede de internet, hoje as estradas digitais são administradas de forma assimétrica por quem controla os cabos.”

O perigo, alerta, é que sem isso a internet pode ser vendida como um modelo fechado, ou seja, algo parecido a uma TV por assinatura. Essa “privatização” privilegiaria o conteúdo de quem pode pagar por ele. No artigo 9 do marco civil, há uma cláusula que garante que a empresa de infraestrutura deve lidar com todos pacotes de informação de forma isonômica. As empresas de telecomunicação, no entanto, se opõe a esse ponto, o que favoreceria seu lucro, em prejuízo do direito civil à internet.

Janela indiscreta

A revelação do ex-agente da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA, Edward Snowden, de que seu país espionava massivamente a comunicação privada de cidadãos, contando com a cooperação de empresas de tecnologia, deixou o mundo inteiro em alerta, inclusive chefes de Estado, como a presidenta do Brasil, Dilma Roussef, que após as revelações de Snowden, colocou a aprovação do Marco Civil como prioridade nacional.

Todo mundo já sabia que o Google e o Facebook usam como matéria prima os dados de seus usuários para vender padrões de comportamento para as empresas. Mas o uso político e de controle dessas informações saiu do campo das teorias de conspiração e de comparações com o livro 1984, de George Orwell, e se tornou algo bastante concreto.

Na ausência de regras que protejam nossa intimidade, nossa vida digital é alvo fácil para interesses privados e um estado que queria vigiar e punir quem discorda dele. O Marco Civil, por sua vez, cria proteções para os usuários da rede. Primeiramente, declara que é ilegal a cooperação de empresas e governos para monitoramento. Apesar de não impedir que as empresas vendam seus dados, a lei garantirá que dispositivos façam que essa escolha seja informada. E também garante que as empresas tenham que apagar seus dados após sua solicitação, o que atualmente não acontece.

Essa questão está em disputa entre a sociedade civil e as forças policiais, que incluíram um artigo que garante a conservação de dados de navegação de determinados sites para investigação e cria uma política de vigilância permanente. Ekman ressalta que tal manobra “inverte o preceito constitucional da presunção de inocência, onde todos passam a ser considerados culpados até que provem o contrário”.

Bom, e agora?

Ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, convoca assinaturas pela aprovação do Marco Civil.

A internet é uma conquista da humanidade e pauta boa parte das relações afetivas, comerciais, sociais e políticas de nossos tempos. É um patrimônio que merece ser entendido, aperfeiçoado e protegido. Ela é, antes de tudo, uma construção coletiva em andamento e a participação consciente de cada um é crucial para que ela continue assim.

O Marco Civil da Internet, que tramita na Câmara dos Deputados desde 2011, vive hoje um momento crucial, conforme sua votação se aproxima. Uma petição circula na internet, encabeçada pelo ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil,  pedindo que o projeto seja votado de forma integral, como foi pensado e elaborado por milhares de pessoas. Além disso, coletivos que lutam pelo direito à comunicação têm realizado uma série de atividades para debater a questão.

Para entender melhor e acompanhar a questão separamos alguns sites e textos que explicam o que é o Marco Civil da Internet. Confira:

Blog do Intervozes
Neutralidade: caminho para a democracia, texto de Marina Pita
Página da Wikipedia contando a história do Marco Civil da Internet
O Projeto de Lei original do Marco Civil
Site criado por voluntários do projeto para acompanhar sua votação
Site da Câmara dos Deputados sobre tramitação do Marco Civil

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