publicado dia 23 de julho de 2015
Territorializar a educação é chave para reduzir as desigualdades de São Paulo
Reportagem: Pedro Nogueira
publicado dia 23 de julho de 2015
Reportagem: Pedro Nogueira
A meta 13, a última do ainda em tramitação Plano Municipal de Educação (PME) de São Paulo (Projeto de Lei N° 415/2012), apresenta uma novidade interessante para a cidade. Ela prevê que as 13 Diretorias Regionais de Educação da Capital (DREs) elaborem – no prazo de dois anos – planos regionais de educação.
Procurada para falar sobre a meta 13 do PME, a Secretaria Municipal de Educação (SME) de São Paulo afirmou que, enquanto o Plano estiver em tramitação, a pasta não comentará o assunto.
Segundo o texto atual, que ainda pode sofrer modificações, os planos regionais deverão estar atentos às metas e estratégias do PME e devem observar as particularidades de cada região, “visando reduzir as desigualdades e promover a melhoria na qualidade do atendimento à população, em especial nas áreas mais desfavorecidas”.
O documento prevê ainda que os planos locais sejam elaborados pelas DREs, com participação da comunidade escolar, além dos setores públicos e sociais que atuam no campo da educação nas diferentes regiões da cidade. A avaliação e monitoramento da execução das metas também figura entre as diretrizes, assim como a necessidade de articulação com outras políticas do território.
Segundo a educadora Helena Singer, o PME tem em si o embrião de uma Cidade Educadora e depende da vontade de políticos e da sociedade para se realizar. Em seu texto “Um plano para tornar a cidade educadora”, Singer defende que a criação de territórios educativos pode ser potencializada pela Meta 13. “Os planos regionais são muito importantes para a conquista de uma Cidade Educadora, especialmente uma megalópole tão diversa como São Paulo. Se estes processos incluírem os outros agentes dos territórios será ainda mais potente”, defende.
Reduzir desigualdades
Mas como isso pode contribuir para reduzir as desigualdades regionais da cidade? E de qual educação estamos falando? Para Elie Ghanem, professor de sociologia da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), é preciso pensar em uma educação que não seja apenas preparatória para um futuro vago, mas uma educação que seja também uma intervenção no presente, que combine o escolar com o não escolar.
“O ponto é entender a educação como uma atividade que abarca diversos aspectos e que reduzir a desigualdade é um direcionamento fundamental dela. Nessa perspectiva, as atividades não podem ser indiferentes e ignorantes às preferências individuais, aos sujeitos e aos coletivos de uma região”, analisa.
O pesquisador, no entanto, lamenta a ausência de um plano que integre a educação municipal – responsável por 29% das matrículas do Ensino Fundamental – com a rede estadual – que atende 46% destes alunos e grande parte do Ensino Médio. Ele também se preocupa com a possibilidade de surgimento de planos tecnocráticos ou contratados. “Eu acho ótimo fazermos planos regionais, desde que eles tenham participação social. Em São Paulo, se não ouvirmos a população usuária será desastroso, pois existem particularidades importantes em cada um dos 96 distritos da cidade. Prescrever soluções homogêneas para a cidade é não querer que se cumpra ou é fazer as pessoas sofrerem”, adverte.
A solução para essa questão, propõe Ghanem, passaria por convocar a população da cidade para se envolver na educação, compartilhando informação com pessoas de todos os estratos sociais, além de uma disposição verdadeira para escutar suas sugestões e transformá-las em um plano de ação. “Tudo isso em um tempo educacional que não é, em absoluto, o tempo eleitoral.”
“Há nisso a possibilidade de as pessoas reconhecerem os diferentes agentes educacionais de um território que não são a escola apenas. São a família, o centro de lazer, de esportes, de entretenimento, são as faculdades, as associações locais, as ONGs, os três poderes do governo. Todo esse conjunto tem que estar envolvido na aprendizagem, para que ela seja coerente e orientada para o respeito dos direito fundamentais, que considere a diversidade e a desigualdade dos territórios”, sintetiza.
Quem veio primeiro: o bairro ou a escola?
No Brasil, quem veio primeiro: o bairro ou a escola?, indaga Ismael Bravo, autor do livro Gestão Educacional no Contexto da Territorialização. “Aqui a gente sabe que primeiro veio o bairro, a urbanização e, mais tarde, chegaram os equipamentos públicos, conquistados com pessoas batendo panela, fazendo abaixo-assinado e lutando. Então, eu tenho que caracterizar essa escola a partir da realidade dela, da sua ordem social, econômica e educativa.”
Bravo acredita que a educação ganha sentido à medida que sabe olhar para seu território e consegue identificar o que esse conjunto de habitantes faz, como vive e o que almeja. “Sabendo isso eu posso usar a meu favor como aprendizado. Se há um movimento reclamando saneamento básico, por que não incluir isso no projeto pedagógico? Não por uma semana, mas por um ano inteiro. Você tem que falar a língua dessa sociedade e é no território que começa essa conversa.”
Cidade Educadora
+ A cidade como currículo: pesquisador espanhol desafia escola a olhar a rua
+Imaginação no poder: crianças se reúnem no Bixiga para pensar a praça Dom Orione
+Escola em São Paulo quer devolver a cidade para as crianças
+Barcelona: comunidade se conecta com escolas para fortalecer território educativo
+Territórios Educativos: como aprender na cidade?
+Ciutat Vella: território que educa seus habitantes dentro e fora da escola
+“Quando você tira a criança da sala de aula e traz para o mundo, a aprendizagem se expande”
Nessa perspectiva, a família e a comunidade também passariam a fazer parte da rotina escolar. Tratar dos temas locais funciona como um convite, algo que faz com que a escola ganhe sentido. “Com esses temas geradores, você pode criar uma sinergia e garantir que a comunidade esteja o tempo inteiro na escola”, afirma.
Uma das metodologias para instaurar essa dinâmica, segundo Bravo, é conhecer os alunos. Tendo em mãos um questionário, que olhe para as potencialidades de determinado lugar, mas também procure entender o desafio que o território representa para cada aluno, é possível avançar no entendimento das tarefas para aquela localidade. “Tem que botar as pessoas pra conversar, pra se entender. Pensar em planos regionais que dialoguem – e sejam fiscalizados – pela comunidade. Não dá pra ser ‘copie e cole’ ou a toque de caixa.”
Utilizando a noção de que o ambiente forma os sujeitos, Bravo conclui: “Eu sempre brinco com aquela ideia de que o homem é formado pelo meio. Mas, ora, o homem cria o meio! Então, talvez, se a gente começar a mudar os homens desde cedo, quem sabe não teremos um meio diferente?”