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publicado dia 22 de janeiro de 2016

SP: Exposição sobre monumentos esquecidos revela a disputa pela visibilidade no espaço público

Reportagem:

Nada como uma data comemorativa para refletir sobre o ano que passou e projetar os que virão. No caso de uma metrópole como São Paulo, que chega nesta segunda-feira (25/1) aos 462 anos, a tarefa é certamente mais árdua. Em uma cidade cosmopolita, diversa, gigante e desigual, desviar os olhos para o passado é fundamental para tentar entender em que momento de sua história a capital paulista está.

É esse exercício que a historiadora, artista e professora da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), Giselle Beiguelman, propõe na exposição Memória da Amnésia, que reúne 16 fragmentos de monumentos que um dia ornaram os logradouros públicos da cidade e, atualmente, se encontravam em um depósito da Secretaria Municipal de Cultura, localizado no Canindé.

A exposição Memória da Amnésia reúne 16 fragmentos de monumentos que um dia ornaram o espaço público da capital paulista.

Estimular o visitante a pensar sobre a construção da memória paulistana começa já na escolha do local da exposição: o Arquivo Público de São Paulo, um lindo edifício projetado por Ramos de Azevedo que divide a praça com uma estação de metrô, uma faculdade e uma escola técnica. O local, porém, passa despercebido para a maioria das pessoas que circulam por ali.

“Quem decide o que deve ser esquecido, como deve ser esquecido e quando deve ser esquecido?” é a pergunta que guiou a criadora do projeto, que levou mais de um ano para ser concretizado.

A exposição Memória da Amnésia reúne 16 fragmentos de monumentos que um dia ornaram o espaço público da capital paulista.

No salão principal do Arquivo, figuram esculturas como “O Escoteiro” e “Via Láctea”, de William Zadig, que já estiveram em um belvedere da Avenida Paulista; fragmentos de um monumento aos heróis da aviação; e as famosas lagostas que adornavam a fonte monumental da Praça Júlio de Mesquita. A cor pesada das obras de bronze e granito conflita com a claridade do espaço; as esculturas deitadas contrastam com o pé-direito alto do salão.

Beiguelman ressalta que a exposição em si não é focada na estética dessas esculturas, mas versa sobre a questão de ausência e presença na cidade, além da disputa de poder no espaço urbano. “Me interessa a ideia do que significa ver e deixar de ver. O direito à memória é muito ligado ao direito ao espaço público”, defende.

Ao longo de sua pesquisa, a professora descobriu que existem em São Paulo 400 obras em logradouros públicos, sendo que 64 já mudaram de endereço – quase metade destas, mais de uma vez. “Todas elas fazem parte da nuvem de memória da cidade. São como monumentos nômades.”

A exposição Memória da Amnésia reúne 16 fragmentos de monumentos que um dia ornaram o espaço público da capital paulista.
Guia de Monumento Nômades.

Para além da exposição, que fica em cartaz até o dia 25/2, o projeto lançou o Guia de Monumentos Nômades, que detalha o percurso de mais de 100 obras que, originalmente, foram expostas na capital paulista. Há também uma campanha de lambe-lambe sobre o tema (os cartazes podem ser recolhidos no local da exposição).

Ela elenca ao menos três motivos que estimulam esse vai e vem: a reação de cidadãos contrários ao monumento, como no caso da obra Beijo Eterno (hoje no Largo São Francisco), banido do bairro do Cambuci em 1956 por ser considerado indecoroso; subprefeituras que preferem arquivar e esconder do que reparar e consertar esculturas danificadas; e as grandes obras viárias que acometem a capital paulista. “Priorizar a mobilidade é uma questão que atravessa a experiência de São Paulo como um todo – e um dos motivos que a faz uma cidade historicamente sem noção daquilo que é público.”

Para Beiguelman, , apesar de haver uma dinâmica de poder muito explícita de quem mantém o monopólio da visibilidade no espaço público, a legitimidade do patrimônio material está justamente na possibilidade de ele ser recriado e repensado. “Devemos contestar os monumentos, os símbolos, para que sejam transformados constantemente.”

A exposição Memória da Amnésia reúne 16 fragmentos de monumentos que um dia ornaram o espaço público da capital paulista.

A exposição, que possui ainda ensaios fotográficos de André Turazzi e Ana Ottoni e vídeo de Cleisson Vidal, estará aberta no dia do aniversário de São Paulo. Para quem tiver interesse em compreender um pouco do que essa cidade já foi – e busca compreender o que ela virá a ser –, aproveite o feriado para visitar a Memória da Amnésia.

Serviço
Memória da Amnésia
Até 25/2 – De segunda a sábado, das 10h às 17h
Arquivo Histórico de São Paulo (Praça Coronel Fernando Prestes, 152 – Luz)

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