publicado dia 2 de outubro de 2020
Quem foi Paulo Freire?
Reportagem: Redação
publicado dia 2 de outubro de 2020
Reportagem: Redação
No fim dos anos 50, começo da década de 60, o Brasil vivia um momento de turbulência politica, mas ao mesmo tempo de muita riqueza cultural. “A alfabetização passou a ser um movimento muito importante para relacionar cultura com educação”, explica o doutor em história e filosofia da educação, Sérgio Haddad em entrevista à Ilustríssima, da Folha, ao falar sobre esse período.
Matéria publicada originalmente na Fundação Telefônica Vivo.
E é neste contexto que Paulo Freire se apresenta na história, desenvolvendo um pensamento pedagógico e assumidamente político. Ele acreditava que o maior objetivo da educação era conscientizar o aluno e criou um método focado em jovens e adultos para alfabetizá-los de maneira consciente, discutindo os problemas sociais. A ideia era fazer com que os estudantes, a partir de sua realidade, percebessem quais são seus problemas e assim modificá-los.
“Para o Paulo Freire, era importante ensinar o adulto a ler para que ele faça uma leitura do seu mundo. Ler as palavras é ler o mundo”, diz educador catarinense Nado Gonçalves, que pesquisa há 30 anos a perspectiva freiriana aplicada ao Boi-de-mamão (manifestação folclórica típica de Santa Catarina) e à cultura popular.
Um dos princípios fundamentais de Freire era de que o educando, alfabetizado ou não, chega à escola levando uma cultura que não é melhor nem pior do que a do professor. “A gente parte do que o educando sabe, para que o educando possa saber melhor”, dizia.
Paulo Reglus Neves Freire nasceu em Recife, Pernambuco, em 1921. Veio de família de classe média, em que seu pai era militar e a sua mãe, dona de casa. Estudou Direito na Universidade do Recife, mas não chegou a trabalhar na área jurídica.
Em 1947, Freire foi trabalhar na diretoria de Educação e Cultura do SESI – o Serviço Social da Indústria de Pernambuco. Foi ali que começou a atuar com a alfabetização de jovens e adultos.
Naquela época, os adultos eram alfabetizados com os mesmos métodos utilizados pelas crianças, mas o pernambucano discordava deste tipo de ensino. A metodologia Paulo Freire consistia em uma maneira de ensinar conectada ao cotidiano dos estudantes e as suas experiências. Ela também se baseava no diálogo entre professor e aluno, transformando-o em um “aprendiz ativo”.
Nado Gonçalves defende que o legado de Paulo Freire vai muito além do método, com um princípio educativo de ética e respeito. “Eu não vou aplicar o mesmo método para uma comunidade pesqueira ou uma comunidade rural. Eu vou usar o mesmo princípio educativo. Respeitar o saber do outro e juntos construir o conhecimento”, afirma.
Paulo Freire saiu do SESI em 1957 e, nos anos seguintes, passou a assessorar campanhas de alfabetização em várias cidades do nordeste. A maior delas foi em Angicos, no sertão do Rio Grande do Norte, em 1963.
A pequena cidade de Angicos acabou se tornando uma palavra emblemática para todos aqueles que se interessam pela educação popular.
Lá foram alfabetizados cerca de 300 alunos, em 40 dias, com o método Paulo Freire. Nesta época, só se podia votar quem sabia ler e escrever, e por isto a campanha de alfabetização foi ganhando fortes proporções políticas. O presidente da época, João Goulart, convidou o educador para criar um plano nacional de alfabetização.
O projeto foi interrompido em 1964 por conta do golpe militar. Sob acusação de doutrinação marxista e traição, o educador foi preso por 72 dias. Exilado, ficou 16 anos fora do Brasil.
Sérgio Haddad conta em sua obra “O educador: um perfil de Paulo Freire” que durante os anos de exílio o pensador nordestino passou por diversos países a convite de governos, universidades, igrejas e movimentos sociais.
Morou primeiro na Bolívia e depois no Chile, onde ficou por quatro anos, e escreveu a sua obra mais famosa A Pedagogia do oprimido. O livro fala sobre a proposta de uma pedagogia crítica, que vai além do método de alfabetização e considera educar como um ato político, propondo uma nova forma de relacionamento entre o professor, o estudante e a sociedade.
Em 1969, foi professor visitante na Universidade de Harvard e atuou no Departamento de Educação do Conselho Mundial de Igrejas, em Genebra. Por este departamento trabalhou por 10 anos com projetos de ação educativa em mais de 30 países – dos europeus aos africanos.
De volta ao Brasil, deu aulas na PUC-SP e na Unicamp, e, de 1988 a 1991, foi Secretário de Educação da cidade de São Paulo.
Hoje, Paulo Freire é considerado um dos mais célebres pensadores da história da pedagogia e está entre os autores mais citados em trabalhos acadêmicos do mundo.
O seu livro, a Pedagogia do Oprimido, é, de acordo com um levantamento no Google Scholar, a terceira obra mais citada em trabalhos na área das humanidades em todo o mundo.
Recebeu o título de patrono da educação brasileira em 2012 e foi o brasileiro mais homenageado da história por títulos de ‘Doutor Honoris Causa’, título de doutor concedido por causa de honra por universidades a pessoas eminentes, que não necessariamente tenham uma graduação acadêmica, mas que se destacaram em determinada área.
O pedagogo foi ainda indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 1995 e ganhou o prêmio de Educação para a Paz da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciências e Cultura (UNESCO) em 1986.
Além disso, mais de 350 escolas ao redor do mundo levam seu nome.
Em 1991, foi fundado em São Paulo o Instituto Paulo Freire com o objetivo de estender e elaborar as ideias do pensador. O instituto preserva os arquivos de Freire, realiza atividades relacionadas ao seu legado e atua em temas da educação brasileira e mundial.
“Ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém educa a si mesmo: os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”, escreveu Paulo Freire.