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publicado dia 26 de maio de 2017

Escolas brasileiras assumem o território em seus projetos pedagógicos

Reportagem:

Do Centro de Referências em Educação Integral

A escola não é uma ilha. Inserida em um território, ela espelha a cultura local dentro das salas de aula e também influencia sua comunidade. A integração entre território e espaço escolar pode se dar de diversas formas e se transforma em processo educativo a partir do momento que propicia oportunidades de aprendizado para crianças e jovens. Confira como algumas experiências no Brasil têm conseguido reverter o cenário de isolamento da escola, garantindo uma educação significativa para seus estudantes:

| Viamão (RS), Ipatinga (MG) e Correntina (BA)
Território: educação e contexto

Na escola rural EMEF Zeferino Lopes de Castro, em Viamão (RS),  os alunos são estimulados a aplicar tecnologias digitais aprendidas nas aulas no cotidiano de suas casas: a fazenda. A rede municipal de Ipatinga (MG), por sua vez, convidou os alunos a mapearem o entorno de suas escolas em busca de oportunidades educativas. Já no Colégio Estadual de Correntina, localizado no município baiano de mesmo nome, a variante linguística da comunidade foi estudada nas aulas de Língua Portuguesa, dando origem a catalogação de termos como “azular”, “biscoitar” e “bucho quebrado”. Além de valorizarem saberes e, portanto, a identidade local, experiências como essas tornam os conteúdos escolares mais próximos do cotidiano dos alunos.

Para a socióloga Helena Singer, o uso do território como campo de pesquisa com base em diversas áreas do conhecimento, como geografia, língua portuguesa, história, entre outras, é a chave para um aprendizado mais significativo. “Isso permite que os alunos estudem na prática conceitos mais abstratos e complexos que os professores podem elaborar futuramente”.

Tal perspectiva também é essencial para que os alunos desenvolvam um senso de pertencimento. “A educação é um processo de crianças aprendendo a viver. E claro que elas precisam aprender a ler e escrever, ciências e literatura, mas elas também precisam aprender a ser cidadãs, a aprender como seu bairro se formou e qual a história da sua cidade”, explica o britânico Tim Gill, uma das maiores referências em infância, em entrevista ao Cidades Educadoras.

Para que isso ocorra, no entanto, a escola também deve se abrir como um espaço comunitário, oferecendo atividades culturais, debates, clubes, dentre outras oportunidades de participação. “Estudantes, professores e funcionários precisam se ver como parte de um coletivo e a escola precisa reconhecer que tem uma missão: ser uma instituição que faça sentido para todos”, explica Helena.

| Itabira (MG)
Participação e construção coletiva: rompendo isolamentos

Dentro dessa perspectiva, Julio Neres, do Núcleo de Educação Integral do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC), desenvolveu uma proposta de educação integral em Itabira (MG).

A ação gira em torno do que ele chama de “estado de escuta permanente”, em que educadores usam o diálogo e a atenção ao que os pais, mães e alunos têm a dizer sobre a experiência na escola e fora dela para, então, compreender o território e sua cultura. Na prática, isso fortalece as reuniões de familiares e alunos, bem como o grêmio estudantil, para uma escuta livre de julgamentos, utilizando o momento como oportunidade de aprender sobre aquela comunidade.

“Não queremos chamar os pais e só avaliar o aluno, queremos saber deles como está o aprendizado da criança e como isso se integra no cotidiano da família. Ouvindo a comunidade podemos apreender os saberes que esse território contém”, explica Julio, acrescentando que, para além dos pais, o “estado de escuta” deve se estender aos funcionários e aos professores.

Outra proposta do educador Júlio Neres é mapear o território, identificando onde as crianças e famílias desenvolvem seus saberes, se reúnem. “Mas não adianta dizer que baile funk não conta, por exemplo, porque isso não é ouvir sem julgar, e nisso se perde a possibilidade de contato”, afirma.

| Bela Cruz (CE)
Protagonismo estudantil: conhecimento a serviço da comunidade

A iniciativa de se conectar com o território não precisa, necessariamente, partir dos educadores. Após instituir uma cultura de estímulo ao protagonismo estudantil, esse movimento surge quase naturalmente, como ocorreu na Escola Estadual Júlio França, em Bela Cruz, Ceará.

Divalda Rios, coordenadora pedagógica, explica que há anos a instituição promove oportunidades e abertura para que os alunos busquem seus próprios objetos de estudo, a partir de temas que são de interesse pessoal, e desenvolvam desde pequenos trabalhos a projetos maiores, individuais ou coletivos.

Em 2015, por exemplo, Marcos Tiago Rios e Erivan Menezes Júnior, então no 9º ano do Ensino Fundamental e 1º do Ensino Médio, respectivamente, tiveram uma ideia: queriam desenvolver um projeto de combate à falta de água na comunidade, principalmente na zona rural e entre a população carente. Para tanto, buscaram o professor de Matemática, Fernando Nunnes, envolvido em iniciações científicas e desenvolvimento de projetos. Hoje, já venceram prêmios nacionais e internacionais, e o projeto segue em implementação, com distribuição de cisternas, plantação de espécies resistentes ao semiárido e outras ações.

“Uma ideia de dentro da escola está surtindo efeitos na comunidade, na tentativa de resolver um problema local”, comemora Nunnes ao afirmar que essa é uma das principais funções da escola enquanto instituição social. “Além disso, o processo de ensino hoje é muito focado no professor, então quando um aluno se torna protagonista é muito gratificante”, diz.

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