publicado dia 13 de maio de 2016
Descentralização: é preciso ampliar a democracia nas cidades
Reportagem: Pedro Nogueira
publicado dia 13 de maio de 2016
Reportagem: Pedro Nogueira
“Quem aqui é conselheiro?”, perguntou o mediador Maurício Piragino, da Escola de Governo, para plateia. “Aricanduva”, “Guaianases”, “Carrão”, “Pinheiros” e diversos outros bairros saíram das bocas dos presentes. “E quem é a favor de eleição direta para subprefeitura?” e cerca de metade dos 60 presentes levantaram as mãos. “E quem tem dúvida?”, a outra metade se fez escutar.
Atualmente, tramitam na Câmara dos Vereadores dois projetos de lei. Em 7 de janeiro deste ano, o prefeito Fernando Haddad (PT) apresentou à Câmara dos Vereadores o PL 04/2016, que prevê eleição direta para as 32 subprefeituras da cidade. Alguns meses antes, o vereador José Police Neto (PSD) já havia feito uma proposta semelhante, por meio do PL 0601/2015. Apesar de trazerem os debates, ambos são criticados por estarem defasados com os novos tempos e por terem sido apresentados com pouco debate popular. Saiba mais.
Na manhã dessa sexta-feira, 13/5, conselheiros dos Conselhos Participativos, ativistas, vereadores e interessados em geral, estiveram na sede da Ação Educativa para discutir “Eleição Direta para Subprefeito: Os desafios para descentralização da cidade”, em seminário organizado pela Rede Nossa São Paulo, que resolveu atacar este espinhoso tema perto de quem está na ponta de lança das experiências de democracia participativa e engajamento social.
“Estamos falando de mecanismos de descentralização da representação política, da aproximação entre a figura do representado para o representante. Hoje vivemos um afastamento das pessoas da política, que é a palavra essencial para nossa convivência como sociedade, pela qual nos confrontamos com o outro em busca do que queremos. Atualmente, essa palavra apenas lembra o que é deletério”, analisou o professor Christy Pato, da Escola de Parlamento.
Escala cidadã
Na opinião de Valter Caldana, professor de arquitetura e urbanismo do Mackenzie, para se conseguir maior participação na vida política e pública da cidade, é necessário que o cidadão sinta-se pertencente àquela cidade. “É na escala cidadã, na capacidade de se fazer projetos e planos do tamanho das pessoas, que você consegue indivíduos interessados na transformação política. Os planos de bairros e projetos locais são efetivamente a possibilidade do resgate do pertencimento e da cidadania. Descentralizar não é uma panaceia, mas é o modelo de gestão que defendo por excelência.”
Para Américo Sampaio, da Rede Nossa São Paulo, que já explicou o que está em jogo nas eleições para Subprefeito no Portal Aprendiz, a questão das diretas nas subprefeituras é apenas um “pontinho”. “É urgente ampliar a democracia na cidade. Com isso sustentamos processos populares. A descentralização é a questão mais importante, fortalecendo a sociedade civil e os conselhos participativos, que são uma experiência interessante, mas que precisa ser aperfeiçoada”, afirmou.
Após estudar modelos de gestão descentralizadas em outras capitais do mundo, como Paris, Londres, Viena e Buenos Aires, Américo ressalta a falta da relação entre orçamento e planejamento regional e critica o papel das subprefeituras apenas como zeladoras do território. “O que nós vemos hoje é que as subprefeituras não participam do planejamento urbano – e tampouco dialogam com os conselhos de maneira efetiva. Há um temor de que a descentralização possa travar a gestão, mas não vimos isso em nenhuma cidade, onde há uma clara e bem definida visão das atribuições e os territórios tem seus trabalhador amarrados num plano de governo da cidade. Não há travamento quando há um plano no horizonte.”
O buraco é mais embaixo
Seguindo a fala de Oded Grajew, também da Rede Nossa São Paulo, Sampaio acredita que a descentralização pode ser um caminho importante para combater desigualdades na cidade, garantindo maior autonomia e poder de reivindicação para os diferentes distritos. Mas, para a urbanista, e professora titular da Universidade de São Paulo, Ermínia Maricato, o buraco “é muito mais embaixo”.
“Não é nem de longe a solução. Olhe para Mauá, Itaquaquecetuba, as cidades da grande São Paulo, que têm prefeituras próprias e continuam em situação desiguais. Existe uma diferença estrutural entre o nosso capitalismo periférico, atacado por seguidos golpes, e a Europa. Nós temos partes inteiras da cidade onde não existe lei nenhuma!”, disparou.
Na visão da urbanista, tais medidas deveriam vir acompanhadas de mudanças intensas na sociedade brasileira, mas que têm que começar de cima para baixo. “Na última década, eu fui em diversas conferências. Nunca fomos tão participativos. E será que isso foi suficiente?”, indaga. “Mais do que inteligentes, temos que ser espertos. Isso tudo só vai funcionar com o povo fortalecido, com poder político e capacidade de mobilização e fiscalização. E isso a gente não vai conseguir sendo obedientes”, sugeriu, em tom otimista.