publicado dia 11 de maio de 2014
Cuidado coletivo de crianças ganha adeptos no Brasil
Reportagem: Danilo Mekari
publicado dia 11 de maio de 2014
Reportagem: Danilo Mekari
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Desde abril de 2013, uma mudança na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional obriga todas as crianças brasileiras a estarem matriculadas em instituições de ensino a partir dos quatro anos de idade.
Além de questionamentos sobre a obrigatoriedade da escolarização, uma dúvida pertinente surge na cabeça de muitos pais e mães do Brasil: o que fazer no período entre zero e quatro anos no que se refere à educação infantil?
As creches públicas vivem em crise permanente – há filas enormes para se conseguir uma vaga. As creches privadas são caras demais para a realidade financeira de grande parte das famílias brasileiras. Na contramão da educação formal, a prática do homeschooling (educação domiciliar) tem crescido no país, mas está longe de se estabilizar e dar conta das demandas educacionais.
Há ainda uma nova iniciativa que vem ganhando adeptos: o cuidado coletivo de crianças – também conhecido como creche parental ou cooperativa de mães. São organizações educativas informais, onde o cuidado com crianças e a manutenção do espaço são compartilhados por mães e pais interessados em vivenciar com mais proximidade a evolução e crescimento de seu filho – mas que também não podem abrir mão de compromissos profissionais que tomam boa parte de seu tempo.
Casinha
“Estava às vésperas de retornar ao trabalho após a licença-maternidade e vivia o dilema: o que fazer com minha criança agora?”, relata Grace Barbosa, editora do site Mãezíssima e mãe de Julia, de dois anos.
“Sempre que podemos, levamos as crianças para contações de histórias, ou formamos uma turminha para visitar algum lugar. O contato com outros ambientes também educa. Só de estar lá e mostrar pra criança que em outros espaços ela precisa agir de outra forma você já está educando”, afirma Grace.
Em parceria com outras quatro mães, decidiram formar em Curitiba a cooperativa Casinha, onde se revezam nos cuidados das crianças. Cada uma fica um dia por semana, das 13h às 18h, na edícula da casa de uma mãe – especialmente preparada para receber as cinco crianças, com balanço, horta e um cantinho para estimular a leitura e as artes. Além disso, contam com uma ajudante diária.
“Tem sido uma experiência incrível e enriquecedora. Percebo que a minha filha nunca sai triste de lá”, revela Grace. De acordo com ela, a faixa etária varia entre 10 meses e dois anos e não demanda necessariamente atividades dirigidas. “Estimulamos brincadeiras, autonomia e relações de afeto. As crianças já se sentem como irmãos, e com isso nos tornamos uma família.”
Democratizar a educação
Mãe de Laura, de cinco anos, a psicóloga e pesquisadora do tema maternidade, Carolina Pombo acredita que as creches parentais são uma maneira de buscar alternativas em um sistema educacional que não responde às necessidades das famílias brasileiras. “É uma iniciativa onde os pais podem revelar suas expectativas perante a educação de seus filhos e influenciar diretamente a infância deles, gerando satisfação em quem participa”, afirma.
Para ela, projetos nesse sentido têm um potencial muito grande de democratizar o acesso à educação também entre famílias mais vulneráveis. “Seria um marco se o governo acompanhasse iniciativas como essas e criasse formas de financiamento para elas. As creches parentais poderiam ser entendidas como empreendimentos de economia solidária”, pontua.
Nosso Jardim
A brasiliense Camila Prando estava à procura de um espaço coletivo, onde crianças pudessem ser cuidadas com a presença mais constante dos pais – dentro da possibilidade de cada um – e onde o grau de institucionalização fosse o menor possível.
Com outras cinco famílias que “compartilhavam percepções semelhantes sobre o espaço de cuidado das crianças”, participou da criação da cooperativa Nosso Jardim. Uma professora de educação infantil também integra a experiência.
“Lançamos o Jardim com uma concepção livre de uma convivência na qual não haja uma relação de ensino-aprendizagem ou de condução em demasia das atividades”, explica a mãe de Olívia, de três anos. “Fazemos um exercício de entender a singularidade e o interesse de cada criança.”
Desafios
Para além da resolução de problemas básicos por meio de uma comunicação efetiva, como rodízio de alimentação e aspectos financeiros, o desafio mais citado por aqueles que vivenciam creches parentais está em conciliar a participação familiar com as atividades e compromissos de trabalho.
“No nosso caso ainda não foi superado. Estamos caminhando no sentido de produzir e construir mais espaços de presença dos pais nas atividades”, afirma Camila. Grace acredita que trata-se de “um projeto que exige tempo e dedicação”.
A parte dos homens
A participação dos homens na educação infantil também é muito lembrada pelas mães que desenvolvem as cooperativas. “No nosso caso, os homens têm trabalho regular e não conseguem passar a tarde com a gente. Contudo, além das reuniões semanais, eles participam do mutirão que fazemos uma vez por mês, e ajudam a produzir novos brinquedos infantis”, relata Grace. Segundo Camila, “a nossa experiência não se reduz à participação das mães, mas também dos pais e companheiros”.
“Como montar uma cooperativa de pais e mães?”
Em seu site, Grace Barbosa fez um passo-a-passo com dicas para quem tiver interesse de começar uma experiência semelhante.
Entretanto, Carolina Pombo afirma que ainda há um receio em passar essas tarefas para os homens. “Não existe licença parental e geralmente quem abre mão de seu salário é a mulher. É um sinal de que esse cuidado continua sendo muito atribuído às mães. É preciso reforçar os papéis do homem nesse compartilhamento de cuidados”, enfatiza. “É importante que a criança cresça tendo confiança tanto em mulheres como em homens.”
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