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publicado dia 28 de janeiro de 2021

A represa como quintal: como o projeto Navegando nas Artes estreita relação entre crianças e natureza

Reportagem:

A represa Billings é um dos maiores reservatórios de água da Grande São Paulo. Seu espelho d’água de formato dendrítico – ou seja, ramificado e irregular –  ladeia municípios como a própria capital, Santo André e Diadema, margeando assentamentos urbanos, zonas rurais agrícolas e até mesmo áreas de preservação do bioma Mata Atlântica.  

Estima-se que 1,5 milhões de pessoas residam em ocupações regulares e irregulares perto da bacia, de acordo com pesquisa de 2017 do Instituto Florestal. A relação entre moradores de bairros como Grajaú (SP) e a represa é marcada por dualidades, como conta Franz Thomas de Oliveira, nascido e criado às margens da Billings:

“Tem vários sentimentos. Um misto de alegria, de habitar esse espaço grande, com muita água. Mas também receio, porque nesse mesmo espaço grande a gente já perdeu amigos. As pessoas gostam de morar aqui, mas muitas vezes essa relação cai em um naturalismo, esquecer de preservar ou dar valor à área verde.”

Franz é coordenador pedagógico do projeto Navegando nas Artes, que desde 2016 leva crianças, jovens e adultos do território para conhecer potências e vulnerabilidades da represa por meio da navegação de barco à vela. O projeto nasceu da atuação da já inexistente ONG Vento em Popa, uma organização cujo trabalho foi continuado por Franz e outros jovens locais. 

“A ideia é incentivar e aproximar os moradores e não moradores a preservar o meio ambiente, tanto a água como recurso natural finito, mas também a mata. É um trabalho de conscientização sobre o meio ambiente, por meio desse esporte”, o coordenador pedagógico adiciona.

Crianças e jovens navegam no quintal que é a Represa Billings / Crédito: Divulgação

Desenvolver outra relação com a natureza e com o território

Embora a navegação de barco à vela seja aberta para todas as idades, uma população mirim ocupa majoritariamente os barcos do projeto Navegando nas Artes. “As oficinas de barco à vela acontecem mais para crianças e jovens entre 7 e 15 anos. Aos fins de semana acontece a vivência de barco a vela, que é mais aberta, qualquer pessoa do bairro pode vir navegar”, conta Franz. “Infelizmente velejar ainda é um esporte elitista e quanto mais a gente democratizar e dar acesso para as pessoas, melhor!”.

Nas oficinas, as e os participantes aprendem termos náuticos e práticas de navegação a vela que vão ajudá-las a navegar pela Billings. De colete salva-vidas, as crianças muitas vezes manejam o barco sozinhas, olhadas por adultos mas autônomas para praticar, observar e brincar. 

A preparação do barco é por si só uma prática corpórea, antes mesmo de deslizá-lo pelas plantas aquáticas que cobrem as  águas da represa. As velas são produzidas com grafites feitos pelas crianças e por artistas do próprio território, notoriamente conhecido por esta e outras manifestações da cultura hip-hop

“O desejo nosso é que a criança consiga, do meio da represa, olhar o bairro e a casa dela, de um ângulo diferente. Que ela veja como a represa é próxima do verde, das matas, e aos pouquinhos, em um trabalho contínuo, que ela tenha uma formação para a vida,  entendendo como pode e deve se aproximar da natureza.” Estas experiências se traduzem em práticas de conservação como mutirões de limpeza, das quais as crianças participam ativamente.

Durante a pandemia, os passeios e as oficinas foram interrompidos.. A sede do projeto Navegando nas Artes funcionou como um centro de doações e acolhida para a população local. 

“Quando comecei a navegar, mudou muito minha vida. Antes de navegar, eu não tinha coragem nem de pôr o pé na água!”, relembra Saymon, criança que participa do projeto e foi entrevistado no documentário O Começo da Vida 2: Lá Fora (Maria Farinha Filmes, 2020), uma produção que investiga a relação entre crianças e natureza e como educadores, famílias e gestores podem criar práticas de estreitamento desse laço. 

“O bairro pra mim já tá perfeito, só o que eu queria é que ele tivesse assim um pouco de árvore e que não fosse tão poluída. O que eu queria mesmo é que essa represa fosse bem limpa mesmo. Tão limpa que até dá para beber água”, continua Saymon.  

Frame do filme O Começo da Vida 2: Lá Fora / Crédito: Divulgação

Trilhas de engajamento do projeto Criança e Natureza

Esta matéria é a primeira de uma série de quatro pautas que trazem experiências e projetos que estimulam a relação entre criança e natureza, em parceria com o programa Criança e Natureza, do Instituto Alana.

É possível acompanhar uma série de conteúdos para estreitar a relação entre crianças e mundo natural se inscrevendo no site do filme O Começo da Vida 2: Lá Fora. Famílias, educadores, gestores e conservacionistas ambientais recebem uma série de três a quatro emails com dicas e práticas sobre o tema. 

Acesse o site do filme O Começo da Vida 2: Lá Fora e se inscreva em uma das trilhas de engajamento. 

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