publicado dia 13 de fevereiro de 2012
“O que é singular no que a cidade já tem e quais as dificuldades para que essa força aconteça?”, questiona a economista e urbanista, Ana Carla Fonseca. A especialista em economia criativa e cidades criativas falou durante o lançamento do projeto “Criaticidades”, na noite de quinta-feira (9/2), em São Paulo.
Na ocasião, cerca de 200 pessoas, entre autoridades, jornalistas e representantes dos cenários artístico e cultural, tiveram a oportunidade de conhecer e debater sobre como a criatividade pode ajudar a desenvolver os municípios e os empreendedores brasileiros.
[stextbox id=”custom” float=”true” align=”right” width=”250″]Economia, de acordo com a etimologia do termo original grego, são “as regras da casa”. Significa como gerir os recursos a partir da sua própria forma de administração.[/stextbox]
Um dos maiores desafios da proposta é a criação de marcos para o desenvolvimento da economia criativa. “A fusão dos modelos de negócios entre o cultural e o financeiro é novo”, afirma Ana Carla Fonseca. “O objetivo é criar conexões entre áreas que antes eram muito feudalizadas”.
Caio Carvalho, ex-presidente da SPTurismo e um dos conferencistas presentes no evento, ressaltou a necessidade de inserir o assunto na agenda das políticas públicas. Segundo ele, “faltam indicadores para que governos, empresas e os destinatários dos recursos entendam o significado do conceito e promovam políticas públicas inovadoras, onde o talento criativo passe a ser a matéria-prima capaz de agregar valor e garantir sustentabilidade”.
Graça Cabral, diretora da São Paulo Fashion Week, presente no lançamento para contar a trajetória do maior evento de moda da América Latina, frisou a necessidade de coalizão entre os diferentes atores econômicos. “Banqueiro gosta de arte e artista gosta de dinheiro. Precisam agora sentar juntos para encontrar uma linguagem em comum”, brincou.
Como parte do projeto foi inaugurado também o portal www.criaticidades.com.br. O objetivo da página é contribuir para a formação de uma rede de cidades criativas – isto é, dar visibilidade às novas soluções para velhos problemas urbanos.
O site trabalha como um agregador de iniciativas no âmbito das ações empreendedoras capazes de transformar a convivência e promover o crescimento local. Nele o internauta encontra notícias, vídeos e a apresentação dos integrantes do Comitê Criativo formado por profissionais de diversos setores que participam da ação.
Cases e entrevistas com brasileiros especializados mostram exemplos práticos e bem-sucedidos de municípios que alcançaram bons resultados na busca por novas alternativas para o desenvolvimento econômico – são notórios: Paraty, com a Flip; Paulínia como pólo da produção cinematográfica nacional; ou ainda Guaramiranga, no Ceará, revitalizada pelo festival de jazz e blues que acontece na cidade desde o ano 2000 durante o Carnaval.
Porto Alegre Wikicidade
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De forma geral, é possível ressaltar três abordagens do conceito de economia criativa, que embasam a plataforma de Criaticidades:
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Indústrias criativas
Entendidas como um conjunto de setores econômicos específicos, cuja seleção é variável de acordo com a vocação da região ou país e potencialidade de geração de riqueza, trabalho, arrecadação tributária e divisas.
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Economia criativa
Além das indústrias criativas, o impacto de seus bens e serviços nos setores econômicos tradicionais (e.g. o impacto da moda sobre o têxtil ou o da arquitetura sobre a construção civil) e as conexões que estabelecem entre eles.
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Cidades e espaços criativos
Vistos como espaços nos quais as conexões, inovações e cultura revelam e valorizam as singularidades locais, em dimensões tão complementares quanto a econômica, a cultural, a social, a urbanística e a turística.
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Outro exemplo de participação criativa nas cidades fomentado pelo uso das tecnologias digitais foi posto em prática em Porto Alegre. Com a experiência do Orçamento Participativo consagrado desde 1989 – sistema em que todos os cidadãos são convidados a reivindicar os benefícios para suas próprias comunidades, decidindo em conjunto onde o dinheiro do orçamento público será aplicado –, a capital dá um novo passo em direção ao aperfeiçoamento dos instrumentos democráticos de controle social ao criar uma rede wiki – isto é, colaborativa – em que se debatem os rumos da cidade.
A partir dos Congressos da Cidade, realizados anualmente, estabeleceu-se uma rede de cuidadores responsável por zelar pela preservação do espaço público, a civilidade no trânsito e as boas relações na vizinhança. Destas ações resultou também o movimento “Porto Alegre: Eu curto. Eu cuido.”, além da plataforma digital PortoAlegre.cc – site no ar desde março de 2011, no qual qualquer participante cadastrado pode postar suas causas e buscar alternativas e parcerias. O secretário de governança da cidade, César Busatto e um dos idealizadores do site, Daniel Bittencourt estiveram na Campus Party 2012 para apresentar as novidades.
Um dos maiores ganhos proporcionados por estas iniciativas, segundo Busatto, está não só no incremento das possibilidades de participação, mas também na descentralização e paulatina mudança de mentalidade a respeito da articulação hiperlocal – ou seja, dos bairros com os seus entornos. “Cria-se um ambiente de colaboração em que todos trabalham juntos pelas mudanças. Isso gera uma interação imediata, em que se cuida melhor do estado das calçadas aos focos de lixo em locais inadequados. A ação inicialmente diante do computador torna-se presencial. O espectro de atuação é amplo”.
Bittencourt contou um pouco mais a respeito da estratégia para envolver as pessoas da cidade. A metodologia está planejada em quatro fases distintas. Primeiro se desperta o sentido de cuidado que se deseja. Depois acontece uma visualização dos dados com indicadores sócio-econômicos dos bairros – um diagnóstico. A terceira fase corresponde à criação de um aplicativo móvel, até que, por fim, os moradores participem de tarefas em prol do desenvolvimento territorial que contabilizem pontos e gerem recompensas para o local.
“Precisamos despertar o senso de co-responsabilidade dos cidadãos. As redes digitais são um caminho propício, porque nelas as pessoas participam de qualquer assunto, mobilizadas pontualmente, sob determinadas demandas”, avalia Bittencourt.
“A partir daí começa a ocorrer uma mudança cultural. Da participação passa-se à colaboração: menos hierárquica, mais aberta, livre, com uma concepção de democracia mais avançada e profunda”, defende o secretário Busatto. O objetivo, segundo ele, é resgatar o poder oriundo da soberania popular. Neste processo, a articulação de redes de cooperação, on e off-line são fundamentais. “Transforma-se uma cidade na medida em que ela é cuidada”, finaliza Busatto.