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publicado dia 3 de dezembro de 2012

Pedagogia Griô promete reinterpretar o estudo tradicional nas escolas

Por Luana Costa, do Blog Educação

Conceito criado a partir da cultura oral chamar a atenção dos acadêmicos.

Imagine um conceito pedagógico com base na cultura da transmissão oral de conhecimento. Essa é a ideia da Pedagogia Griô, reinterpretada pela coordenadora pedagógica da ONG Grãos de Luz, Líllian Pacheco. O conceito surgiu da Ação Griô, que tem como objetivo a valorização dos mestres e mestras portadores dos saberes e fazeres da cultura oral, os chamados griôs, e o fomento da transmissão desta tradição.

O termo griô surgiu na região do noroeste da África. “Lá, a colonização foi francesa, por isso, os mestres eram chamados griots, que denomina figuras como contadores de histórias, genealogistas, mediadores políticos, comunicadores, cantadores e poetas populares. Os griotstêm diversas formas de expressão, mas em comum são responsáveis pela biblioteca viva da tradição oral. Nós abrasileiramos o termo para criar uma metodologia de diálogo com as tradições orais das nossas comunidades. Assim, surgiu o griô”, explicou Pacheco.

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O intuito desse novo conceito pedagógico é universalizar os mestres detentores do conhecimento. “Há diversos mestres nas comunidades que usam a transmissão oral para manter a tradição. A tradição oral tem conhecimentos maravilhosos para a humanidade e guarda isso de forma que só pode ser passada de geração em geração. Por que não agregá-la, então, à tradição escrita utilizada na educação formal das escolas?”, questionou.

A tradição escrita é o conceito usado nas escolas brasileiras, que teve como base a colonização europeia. “Acredito que, como afrodescendentes, devemos valorizar mais a tradição oral, porque faz parte da nossa história como brasileiros. Muitas coisas que nossos antepassados viveram só poderão ser transmitidas pela tradição oral. Por isso, a figura do griô é tão importante”, explicou a coordenadora.

Pacheco defende a ideia de que tanto a transmissão escrita quanto a oral devem ganhar seu espaço e dialogar entre si. Para ela, esse diálogo pode ajudar na melhoria da qualidade de ensino. “A Pedagogia Griô nasceu, sobretudo, da necessidade de diálogo entre as duas tradições. Muita coisa em uma pesquisa, por exemplo, não pode ser vista porque não somos treinados para entender a tradição oral nas escolas. Por isso, as duas devem ser casadas para que haja a absorção total do conteúdo.”

Para que ocorra o diálogo, há um processo em que o educador da escola e o griô da comunidade dialogam de uma forma mais significativa. “O griô sai caminhando, como acontece na África e em diversas aldeias indígenas, atuando como um livro, contando as histórias que ele sabe da comunidade, da maneira dele, que pode ser através de um canto ou de uma dança. Na tradição oral, o livro é o corpo. Esse processo pode ser adaptado de acordo com a realidade de cada escola”, contou.

A Pedagogia Griô já atingiu, em média, um milhão de pessoas, em 130 ONGs e 130 escolas e universidades públicas. A formalização do conceito será feita através da Lei Griô, em tramitação no congresso nacional. A lei tem como principal mecanismo a oferta de bolsas de incentivo para os griôs, para que eles promovam o encontro de tais saberes com a educação formal por meio de encontros regulares de compartilhamento e troca de experiências de educação e cultura.

Conceito entra na universidade

A pedagagia criado a partir da cultura oral, começou a chamar a atenção dos acadêmicos. O professor Sérgio Bairon, da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo – ECA USP, está apostando na tradição oral como grande chave para a melhoria da Educação. “Essa chave é uma estratégia, uma metodologia de interlocução da tradição escrita com o saber oral. Isso é riquíssimo”, afirmou.

Para o educador, hoje, há um déficit muito grande de sensibilização para a cultura nacional nas escolas. “Somos ensinados a sentir orgulho da nossa descendência, quando, na verdade, somos todos brasileiros. E a nossa miscigenação deveria fazer parte da educação formal das escolas. A cultura europeia ainda é a base da educação. Esse outro universo, como não tem material escrito, é pouco ou nada ensinado nas escolas. Isso é triste, porque uma criança brasileira carrega consigo uma história viva – ainda que não faça ideia de que está viva –, que faz parte do que somos hoje”, declarou.

A Pedagogia Griô, além de trabalhar a criatividade dos alunos, também consegue desenvolver a sensibilidade às questões culturais. “O conceito é baseado, sobretudo, nos mestres, eleitos pelas próprias comunidades como mestres. Então, o respeito e a sensibilização devem estar presentes o tempo todo no processo de aprendizagem”, explicou o professor da USP.

Como implantar?

Para Bairon, o grande problema na implantação da Pedagogia Griô nas escolas está nos cursos de licenciatura, na formação dos professores. “Hoje, não existe um curso de licenciatura que agregue a tradição oral. Não tem um contexto no ensino formal que possibilite essa relação direta com a tradição oral”, disse.

Por isso, a ONG Grãos de Luz fez uma parceria com a USP e com outras universidades federais, como aUniversidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e a Universidade Federal do Rio Grande – FURG, para a criação de cursos de extensão e pesquisas na área. A USP oferecerá o curso Pedagogia Griô e participação partilhada do conhecimento, entre os dias 5 e 10 de dezembro.

O curso acontecerá no  Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos – Diversitas, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – FFLCH. “Os participantes conhecerão os princípios básicos da Pedagogia Griô e da produção partilhada do conhecimento”, explicou o educador.

Esse é um grande avanço para o movimento Ação Griô, que tem como objetivo a valorização dos mestres e mestras portadores dos saberes e fazeres da cultura oral. “A ideia é, futuramente, criar uma pós graduação emPedagogia Griô e promover a produção compartilhada do conhecimento.  Teríamos professores, pesquisadores e mestres griôs dando aula”, disse.

Para o professor, ainda há um longo caminho para a valorização do conceito nas escolas, mas, com a parceria com as universidades e a aprovação da Lei Griô, o objetivo está próximo de ser cumprido. “Enquanto não forem criadas políticas públicas que desenvolvam estratégias para esse saber entrar na escola, o que pode ser feito fica a cargo do professor, individualmente. A ideia principal do curso é fazer com que os profissionais implantem o conceito por conta própria”, completou.

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