publicado dia 19 de março de 2013

Por Lauro Neto e Leonardo Vieira, do O Globo
Um vestibulando incluiu no meio de sua redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) uma receita de Miojo e, mesmo com a provocação, atingiu 560 pontos em 1000. O tema da redação solicitava ao aluno um texto dissertativo sobre os movimentos migratórios para o Brasil no século XXI. Dois corretores avaliaram como “adequada” a abordagem do candidato.
Quatro das 24 linhas do texto foram dedicadas para descrever o modo de preparo da massa. Do começo da prova até o segundo parágrafo, o candidato comenta a questão da imigração. No parágrafo seguinte ele descreve o modo de preparo do alimento:
“Para não ficar muito cansativo, vou agora ensinar a fazer um belo miojo, ferva trezentos ml”s de água em uma panela, quando estiver fervendo, coloque o miojo, espere cozinhar por três minutos, retire o miojo do fogão, misture bem e sirva”.
A dissertação é retomada no parágrafo seguinte, e finalizada com “uma boa solução para o problema o governo brasileiro já está fazendo, que é acolher os imigrantes e dar a eles uma boa oportunidade de melhorarem suas vidas”.
De acordo com o Guia do Participante, um dos critérios para se tirar nota 0 é a fuga total do tema, impropérios ou atos propositais de anulação. A prova, com a correção, foi postada pelo estudante no seu perfil do Facebook, com o comentário irônico: “bela avaliação!”.
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), o aluno não fugiu do tema nem teve a intenção de anular a redação, já que não feriu os direitos humanos e nem usou palavras ofensivas. Em nota, o órgão afirmou que “a presença de uma receita no texto do participante foi detectada pelos corretores e considerada inoportuna e inadequada, provocando forte penalização especialmente nas competências 3 e 4”.
O candidato alcançou 60% da nota na competência 2 da correção, que avalia a compreensão da proposta da redação e a aplicação de conhecimentos para o desenvolvimento do tema. Pela nota, o MEC considerou que o estudante tratou o tema de forma “adequada”, embora “previsível” e com “argumentos superficiais”. Já na competência que avalia a coerência de argumentos, o vestibulando atingiu 50% da nota.
Para o professor de redação do curso Pensi e da Escola Modelar Cambaúba, Raphael Torres, o candidato cometeu erros graves ao usar a primeira pessoa do singular e verbos no imperativo. “A partir do momento em que se escolhe falar de Miojo, o candidato quebra a estrutura dissertativa pedida no edital. Mas a banca não enxerga isso como impropério. Ela pega as próprias brechas que fez com o Guia do Participante para legitimar a nota que deu. Ele deveria tirar uma pontuação muito mais baixa do que 560”, argumenta.