publicado dia 2 de setembro de 2013
Carta de aluno do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) divulgada durante a primeira paralisação estudantil da história da instituição. Entre as revindicações, está uma reforma nos sistemas avaliativo e pedagógico.
Meu nome é Walter, sou aluno de Engenharia da Computação da turma 2014. Primeiramente, para aqueles que acharam as notas oficiais do Centro Acadêmico ofensivas, saibam que me controlei ao escrever todas elas. Esse texto soará bem mais agressivo, e é para ser agressivo, porque não teve um só dia nesses últimos quatro anos em que não tenha me sentido agredido aqui dentro. Não só eu, mas praticamente todos os alunos e muitos professores também.
Sim, professores também.
Professores que se esforçam, se renovam, que tentam, mas que, ainda assim, lidam com alunos moribundos e apáticos em suas aulas e que, assim como nós, tem suas vozes caladas em nome da imaculada tradição iteana.
A esses professores eu peço humildemente desculpas.
Desculpa pelas próximas palavras e desculpas por ter sido um aluno tão medíocre até então. Mas, em meu favor, tenho a dizer que sou exatamente aquilo que essa instituição quer que eu seja.
Um aluno medíocre.
Desde o início eu já sabia que seria assim. Meu primeiro contato com o ITA, em uma palestra com o pró-reitor, já havia determinado isso.
Ainda lembro do teor do discurso:
“Parabéns por terem passado, agora os critérios de desligamento.”
5 Is, Ds, Inferninho, trancamento, desligamento…
Nada de incentivo.
Nada de falar como cada um de nós temos habilidades únicas e que no ITA poderíamos desenvolvê-las ainda mais, de modo a um dia mudar o Brasil. Quem sabe o mundo.
Só a pressão.
Um jogo de duas vidas e cinco continues.
Diamantes se forjam sob pressão, disse alguém.
E por que é feito assim?
Tradição.
“Os bixos de hoje querem transformar o ITA numa escola second classcomo a FGV e a USP” , disse um formado das antigas no alto da sua arrogância em uma lista de e-mails.
Pressão estúpida!
Tradição estúpida!
Alunos que entram motivados e saem odiando a carreira que escolheram, a Divisão de Alunos sofrendo conosco sem poder fazer nada, professores abusivos, alunos tendo síndromes de pânico, TOC, depressão, surtos psicóticos…
Preciso mesmo continuar para convencer vocês de que estamos vivendo uma tragédia anunciada aqui? E que vocês estão sendo negligentes ao saber de tudo que acontece e não fazendo nada pra impedir? Preciso dizer que vocês poderiam ser processados por isso?
Isso aqui não é uma discussão pedagógica, senhor reitor e senhores professores. Isso aqui é um “basta”.
Apesar da tentativa bem-sucedida de descaracterizar todo o sentido de uma paralisação (só metade do dia sem aulas, com reposição e presos dentro de um auditório), o nosso sentimento não mudou. Na verdade vocês deram um tiro no pé. Ao nos trazer para cá, estamos dando a vocês uma última chance de tomarem providências.
Depois disso vai ser a mídia e a justiça.
E não pensem que teremos receio em manchar o nome do ITA, procurando a mídia para falar tudo o que acontece aqui dentro. Aliás, para conhecimento geral, a presença da mídia já havia ganhado a votação para estar presente já nessa primeira paralisação e até mesmo aqueles que eram contra defendiam ela em um segundo momento.
Não pensem que o medo de perder o diploma nos impedirá.
Caiam na real e desçam do pedestal da arrogância comum a muitos de nós iteanos. Nosso diploma não faz mais milagres como há 30 anos e nem de longe vale todo o sofrimento passado por nós e por professores decentes dessa instituição.
Nossas reivindicações são justas e não têm nada de absurdas como sugerido em nota. Se fossem, não teriam sido apresentadas por um professor em 1999 durante uma reunião da Congregação.Isso só mostra o quanto estamos atrasados e presos em uma mentalidade retrógrada.
O mundo mudou.
Os valores mudaram.
O ITA não.
Mas espero que hoje isso mude.
Muito obrigado pela atenção.