publicado dia 6 de fevereiro de 2014
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Qual é o denominador comum entre os coletivos Baixo Centro e Pombas Urbanas, os espaços independentes Matilha Cultural e Casa da Lapa e o grafiteiro Mundano? A resposta é simples: são esses alguns dos atores que promovem a ocupação das ruas, paredes e espaços vazios de São Paulo com arte e cultura.
E, a partir de agora, o trabalho desses artistas – muitas vezes considerado ilegal e underground – pode ser finalmente reconhecido e estimulado pelo poder público da capital paulista.
No dia 22/1, em um evento no Largo da Batata, a prefeitura de São Paulo anunciou o lançamento do Plano de Ocupação do Espaço Público pela Cidadania, documento inédito nos 460 anos de história da cidade.
O Plano pretende responder à demanda das inúmeras iniciativas de intervenção urbana – com as mais variadas linguagens e formatos – que surgiram nos últimos anos, além de estabelecer a cidadania nas ruas como prioridade na agenda municipal das políticas públicas.
Arames farpados
Para o coordenador de Promoção do Direito à Cidade, subpasta da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), William Nozaki, o Plano estimulará as intervenções urbanas já existentes e fomentará novas maneiras de ocupar o espaço público. “Entendemos que, para dar concretude a esses trabalhos de direitos humanos, é necessário dar espaço ao direito à cidade, pois o espaço público é um lugar de encontros, de conhecimento, enfim, uma pauta que nos ajuda a promover os Direitos Humanos e a Cidadania”, afirma Nozaki.
O grafiteiro Mundano, citado por Nozaki como um possível parceiro, acredita que o poder público demorou para identificar o crescimento das ocupações criativas e artísticas do espaço público. Mundano, porém, garante que valoriza a ideia e está disposto a dialogar, apesar de ainda não ter sido procurado. “As pessoas estão muito trancadas e isoladas dentro de condomínios, muros sociais, arames farpados. Uma das coisas mais interessantes da cidade é quando todo mundo se mistura na rua”, defende o grafiteiro.
Para Nina Liesenberg, integrante da Matilha Cultural – que também será procurada pela Secretaria –, a iniciativa da prefeitura deve contribuir para reverter a atual situação de esvaziamento dos espaços públicos da cidade que, segundo ela, é fruto da criminalização e do excesso de burocracias enfrentadas por aqueles que buscam os órgãos públicos para organizar alguma atividade.
Desburocratizar
Nozaki garante que a prefeitura caminhará no sentido de desburocratizar os procedimentos e processos enfrentados hoje pelos coletivos. “Vamos lançar no primeiro trimestre um edital específico para fomentar propostas de intervenção em espaços abertos”, descreve o coordenador. Além disso, será organizado um guia explicativo de ocupação do espaço público com sistematização e publicização de todos os procedimentos necessários para tanto, “uma das demandas mais candentes dos coletivos”.
“Essa desburocratização é interessante e a cidade só ganha com ela”, afirma Mundano, que revela ter grande parte de seu trabalho “na ilegalidade” porque não tem paciência nem disposição de esperar a burocracia. “Hoje muitas das melhores ocupações são ilegais, já que não têm filtro, são reais e verdadeiras. Agora, esse Plano permitiria elaborar trabalhos mais profundos e permanentes”, acredita o artista.
Nina afirma que, dentre as intervenções urbanas possíveis, a Matilha Cultural poderá contribuir com música, oficinas, divulgação e promoção de espaços comunitários de construção e deliberação popular.
Ações
Dentre as ações previstas para o Plano estão a realização de atividades de combate à homofobia; propostas voltadas para jovens nas linguagens de hip-hop, funk e skate; a construção de um monumento em respeito à população em situação de rua; a regularização de festas culturais e festividades migrantes e o mapeamento de logradouros passíveis de alteração no nome.
“Nesse processo de ressignificação da cidade, os endereços com nome de personagens vinculados a ditaduras militares ou reconhecidos violadores de direitos humanos serão passíveis de troca”, projeta Nozaki. O coordenador explicou que o Plano é intersetorial e unirá esforços não apenas da SMDHC, mas também das pastas de cultura, saúde e desenvolvimento urbano. “O direito à cidade não é monopólio de uma área ou um capítulo de um setor, mas sim um compromisso de toda a prefeitura.”
Ruas vivas
Nina ressalta que o Plano pode recuperar o sentimento de pertencimento, o respeito e a responsabilidade e a noção de que a cidade precisa das pessoas para ser um bom lugar onde morar. “Com as ruas vivas, a cidade vive sua potência, que reside justamente na riqueza que nasce dos encontros entre as pessoas”, reflete.
Mundano afirma que está disposto a fazer ocupações criativas. “Vou aproveitar esse diálogo para propor coisas novas para a cidade – mas quero ver as coisas acontecendo. Vou ser o primeiro a cobrar esse discurso na prática”, adverte o grafiteiro.
“O Plano nasce com o espírito de somar esforços contra o travamento e a proibição da cidade. Queremos uma São Paulo aberta, rica e agregadora”, conclui Nozaki.
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