publicado dia 16 de setembro de 2024
Manto tupinambá é recebido por indígenas em cerimônia oficial no Museu Nacional
Reportagem: Tory Helena
publicado dia 16 de setembro de 2024
Reportagem: Tory Helena
Resumo: Considerado sagrado, o histórico manto tupinambá do século 17 foi acolhido por cerimônia e comitiva indígena ao longo de dois dias no Rio de Janeiro (RJ). A apresentação oficial, celebrada no Museu Nacional em 12/09, contou com a presença de autoridades como a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e o presidente Lula. Ao menos 170 indígenas do povo Tupinambá participaram da recepção.
Patrimônio dos povos indígenas e sagrado para os Tupinambás, o manto tupinambá foi recebido por crianças, adultos e anciões do povo originário, em cerimônia realizada no Museu Nacional, localizado na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro (RJ).
Construído com penas vermelhas da ave guará e fibras vegetais, o artefato data do século 17 e foi devolvido ao Brasil após ficar mais de 300 anos na Dinamarca. “O manto é o nosso ancião mais velho”, definiu o cacique Sussuarana Morubyxaba Tupinambá à Agência Brasil.
A comitiva indígena conduziu a celebração do reencontro por dois dias, em 10 e 11/09, antes da cerimônia oficial de apresentação do artefato, realizada em 12/09 com a presença de autoridades como a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com o Ministério dos Povos Indígenas, os Tupinambás revezaram-se em grupos menores para homenagear o manto sagrado durante a vigília. O artefato foi também exibido de pé, um pedido da cacica Jamopoty Tupibambá.
“Hoje choramos porque ele voltou para nós. Isso é afirmação cultural, afirmação de um povo. Nos fizeram extintos e hoje nós temos um manto de mais de 330 anos, que ficou na Dinamarca preservado para mostrar ao mundo que nós estamos aqui, estamos vivos e somos a raiz de um povo”, disse a cacica Jamopoty, em discurso aos Tupinambá.
“Nós viemos porque o manto queria nos ver. Nossos parentes também terão a oportunidade de visitá-lo e vê-lo. Não somos os indígenas de 1500, somos um povo novo, mas que ainda precisa demarcar nossa terra. Tiraram nosso direito de viver e tiraram nosso idioma, mas aqui permanecemos. Nós somos Tupinambá”, complementou ela.
A recepção de acordo com as tradições indígenas foi organizada após reclamações do povo Tupinambá, que cobraram mais diálogo do Museu Nacional e das autoridades envolvidas durante o processo de devolução do manto ao Brasil.
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“Vivemos num território que tem 47 mil hectares, em três municípios, e abriga 8 mil tupinambás vivendo do extrativismo, da pesca, da agricultura. Esse território está identificado e delimitado pela Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas]. Ocupamos 80% desse território, porque fizemos nossa retomada e não resta mais nenhum impedimento para que o governo brasileiro assine a portaria declaratória do povo tupinambá”, disse o cacique Sussuarana à Agência Brasil.
Os Tupinambás também reforçaram o pedido de proteção e demarcação do seu território.
“A vinda do povo tupinambá aqui é em vigília, em ritual, mas a gente também quer que os nossos governantes façam valer o que está na Constituição e demarquem o território tupinambá de Olivença. Sem esse território, não podemos viver”, defende.
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Além de afirmar que dialogará com o Ministério da Justiça para demarcar a Terra Indígena de Olivença, no sul da Bahia, onde vivem os Tupinambás atualmente, o presidente Lula destacou o caráter provisório da alocação do artefato no museu carioca.
“O manto está no Museu Nacional, mas espero que todos compreendam que o lugar dele não é aqui. Tenho certeza de que vamos ter a compreensão do governador da Bahia de que ele tem a obrigação e o compromisso histórico de construir um lugar que possa receber esse manto e preservá-lo para que não venha a ser estragado”, disse Lula durante a cerimônia oficial, em 12/09.
Também chamado de “Assojaba Tupinambá”, o manto sagrado tupinambá devolvido ao Brasil é um dos 11 remanescentes e um dos mais bem preservados do mundo.
Não há registros de como o artefato saiu originalmente do país e foi levado até a Europa, onde estava pelo menos desde 1689. Ao longo da invasão europeia no Brasil, os mantos produzidos pelos Tupinambás marcaram o imaginário dos colonizadores.
“Os mantos assim como as plumas das diversas aves que habitavam o novo mundo, rapidamente se tornaram elementos muito desejados pelos colonizadores, que levaram diversas peças para o velho continente”, descreveu a pesquisadora Caroline da Costa no artigo “O retorno do manto tupinambá: diálogos para a construção de uma história da arte indígena”.
Povo indígena brasileiro do tronco linguístico Tupi, os Tupinambás foram um dos primeiros a entrar em contato com os colonizadores europeus nos séculos 16 e 17. Reconhecidos pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) apenas em 2001, estima-se que existam cerca de 8 mil indígenas tupinambás no sul da Bahia.
O retorno aconteceu após anos de negociações entre as autoridades dos países, que contaram também com o protagonismo das comunidades Tupinambás da Bahia.
*Com informações da Agência Brasil e do Ministério dos Povos Indígenas