publicado dia 16 de setembro de 2016
Espalhar e convergir culturas potencializa resistência de imigrantes em São Paulo
Reportagem: Danilo Mekari
publicado dia 16 de setembro de 2016
Reportagem: Danilo Mekari
O quarto e último debate do Seminário Internacional Educação e Migração: Caminhos para uma Cidade Educadora evidenciou os desafios e lições de resistência das mulheres migrantes perante a sequência de violações que, por conta de sua condição, sofrem diariamente nas cidades – locais que ainda são epicentro de preconceito e violência dirigidas ao corpo feminino e também à figura do migrante.
“Para transformar a nossa realidade, também precisamos de uma transformação em nós mesmos”, clamou Jobana Moya, integrante do projeto Equipe de Base Warmis – Convergência de Culturas, formado por mulheres voluntárias que promovem atividades em suas comunidades, em busca de melhoria nas condições de vida.
Organizado pela Associação Cidade Escola Aprendiz, por meio de seu programa Cidades Educadoras, em parceria com a Editora Moderna e apoio do Museu da Imigração, o Seminário Educação e Migração: Caminhos para uma Cidade Educadora reuniu educadores e ativistas da área para debater sobre os desafios que permeiam a construção de uma Cidade Educadora no contexto das populações migrantes.
Natural de Cochabamba, na Bolívia, Jobana vive no Brasil há uma década e endossa que a comunidade migrante produz muitas ações e atividades na cidade, mas pouca gente tem conhecimento desse fato por conta da invisibilidade a que esta população está submetida. Seu projeto organiza rodas de conversa com temáticas variadas durante a Feira da Kantuta, encontro semanal e tradicional da comunidade boliviana que vive em São Paulo.
Entre os temas rotineiramente debatidos estão os cuidados na gravidez, o Estatuto do Estrangeiro e o protagonismo da mulher. “Nossa luta conversa com a luta das mulheres brasileiras. Por conta do estigma, as migrantes grávidas são ainda mais maltratadas.”
Jobana aposta na força da cultura dos migrantes como uma forma de resistência. “A globalização quer que todos sejamos iguais, mas temos particularidades. Podemos valorizar essa diversidade e a partir dela construir algo novo”, acredita a boliviana. “Se não se pensam as políticas públicas desde a interculturalidade, a população migrante nunca será realmente contemplada.”
“Quando sentimos que pertencemos a esse lugar a ponto de lutar pelos nossos direitos?”, começou questionando a também boliviana Veronica Yurja, representante do Projeto Si Yo Puedo. “As pessoas se movem em busca de felicidade. Para se manter vivo, alimentar sua família, buscar um sonho, mas ninguém sai de sua cidade natal sem uma história.”
O livro “Histórias que se cruzam na Kantuta” será lançado no domingo, dia 25/9, a partir das 16h durante a feira no local (rua Pedro Vicente, 625 – Pari). Organizado pelo projeto Si Yo Puedo, a obra é resultado de um projeto de história oral e tem o objetivo de resgatar memórias de imigrantes.
Formado por voluntários e voluntárias de várias nacionalidades, o Si Yo Puedo funciona como um espaço de acolhimento e orientação aos jovens imigrantes, promovendo a democratização do conhecimento e da informação. “A migração é um direito e não vai ser a mídia e as políticas de fronteira que vão destruir isso. Se migrar não fosse humano, a gente seria árvore, teríamos raízes”, define Veronica, que também critica o processo de globalização que estimula a circulação de dinheiro e de conhecimento, mas limita a mobilidade humana.
A boliviana também acredita na potência educadora que há na multiculturalidade existente no Brasil. “Se em uma sala de aula há muitos filhos de nordestinos, deve-se falar da cultura do nordeste. Se há migrantes e filhos de migrantes, a cultura latino americana deve ser uma prioridade. Quanto mais multicultural o povo brasileiro se reconhecer, muito mais conhecerá a sua identidade.”
Para Guilherme Otero, da Coordenação de Política para Migrantes da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo, a ação de migrar é sempre um ato político. Ele elencou quatro elementos que garantirão a continuidade de uma política pública direcionada à população migrante, seja qual for o novo prefeito da capital paulista: a criação da coordenação em que trabalha; do Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes e Refugiados (que atende pessoas com e sem documentação); a lei municipal dedicada à população migrante e a criação do Conselho Municipal de Migrantes.
(A foto que abre esta matéria é de autoria de Sergio Gonzalo Cuellar Mansilla e foi clicada na Feira da Kantuta)