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publicado dia 7 de outubro de 2015

Museu da Língua Portuguesa se conecta ao território e fortalece comunidade local

Reportagem:

Prestes a completar uma década de existência, o Museu da Língua Portuguesa (MLP) recebeu, até agosto de 2015, cerca de 3.850.000 visitantes. O número é expressivo para um equipamento cultural localizado no coração de São Paulo, dentro da Estação da Luz – mas não acomodou a gestão do museu, que hoje busca trabalhar mais diretamente com o território onde está inserido, dialogando com a comunidade e abrindo seu espaço para promover cidadania.

Em parceria com a Sala Futura, projeto de midiateca do Canal Futura, a instituição vem organizando, desde o início de 2015, visitas ao acervo de grupos de mulheres em situação de prostituição no Parque da Luz e grupos de transexuais da região.

“Desde que nasceu, o museu pensa o seu papel neste território, bairro, cidade, país”, afirma Marina Toledo, coordenadora educativa do MLP, ressaltando que a Luz é um dos lugares mais complexos da capital paulista, pois, além de reunir diversas comunidades de migrantes e imigrantes em torno de seu comércio movimentado, possui inúmeras questões sociais, como ocupações de moradia, moradores de rua, prostituição e uso de crack. “De que forma o acervo do museu, que é público, pode ajudar as pessoas nessa busca de identidade e cidadania?”, pergunta Marina.

Desde o início de 2015, a instituição promove visitas ao acervo de grupos que sofrem com a vulnerabilidade social na comunidade local.
Espaço da Sala Futura, no Museu da Língua Portuguesa.

A Sala Futura também realiza ações com crianças que moram nas ocupações ao redor da Estação da Luz. A partir de questionamentos acerca do território, foi produzido um mapa com o que elas conhecem e não conhecem e com as mudanças que percebem ali.

A partir da instalação da Sala Futura, no começo de 2014, a instituição partiu em busca de novas parcerias na região. Produziu um mapeamento com os equipamentos culturais e educativos locais e foi atrás de parcerias para potencializar esse trabalho. “Acreditamos no trabalho em rede e no papel de cada um dentro de um projeto mais amplo. Nós fortalecemos o indivíduo com a cultura, as organizações de saúde promovendo hábitos saudáveis, a educação promovendo aprendizagem – é assim que entendo uma Cidade Educadora. Não tínhamos condições de fazer isso sozinhos.”

O projeto Mulheres da Luz, por exemplo, articulou uma parceria entre a Secretaria de Políticas para as Mulheres e o coletivo “Mulheres que atuam com mulheres”, que trabalha especificamente com mulheres em situação de prostituição. “Aliamos o olhar político e o comunitário, pensando junto uma proposta para esse público”, conta Wilmihara Santos, mais conhecida como Iara, articuladora da Sala Futura.

“A Sala serviu como espaço de articulação, onde realizamos oficinas e rodas de conversas mensais.” De acordo com ela, a demanda partiu das próprias mulheres, que gostariam de aprender mais sobre sexualidade, auto cuidado e organização financeira, entre outros temas. “Estamos formando essa rede para atender uma necessidade que vem da comunidade”, observa.

Mapeamento realizado pela Salta Futura com os equipamentos culturais da região.
Mapeamento realizado pela Salta Futura com os equipamentos culturais da região.

O sucesso da ação já garantiu uma visita das mulheres à Pinacoteca do Estado, instituição vizinha ao MLP.  Conhecer o mais antigo museu de arte de São Paulo era um dos sonhos de Cleonne Santos, que já esteve em situação de prostituição e hoje conduz o diálogo entre as mulheres da Luz e os equipamentos locais.

Sentada em um banco do Parque da Luz, ela transforma em palavras as recordações do dia em que conheceu o espaço e as esculturas de Auguste Rodin. “Fiquei meio boba. Tudo que a gente sonha muito, quando vê, fica meio criança, sabe?”, confessa a senhora de 58 anos.

Ela relembra também um dos primeiros projetos voltados para a leitura, que “circulava” pela região da Luz: a “bicicloteca”, mistura de bicicleta e biblioteca distribuiu livros para as mulheres que ali trabalhavam. “Estava todo mundo muito ocioso aqui, o dia inteiro. Tinha que ter uma ocupação”, aponta. Por questões burocráticas, a bicicleta foi proibida de circular no parque – Cleonne, então, passou a incentivar a realização de rodas de conversa para discutir políticas públicas e direitos sociais. Atualmente, cerca de 50 mulheres se reúnem mensalmente.

Desde o início de 2015, a instituição promove visitas ao acervo de grupos que sofrem com a vulnerabilidade social na comunidade local.
Cleonne busca melhores condições para as mulheres da Luz.

Os encontros são realizados na Sala Futura e na Casa de Chá do Parque da Luz. “Estamos formando uma rede para tirar da invisibilidade, pois as mulheres que vivem em situação de prostituição são o público mais invisível que existe, não existe nada dirigido a elas, que não têm nenhum direito respeitado.”

Cleonne comemora a nova relação construída com espaços como o MLP e a Sala Futura. E afirma que, a partir de agora, essa parceria tende a se aprofundar. “A cultura é assim: quando a gente tem acesso a um pouquinho, sempre quer mais”, observa, estampando um largo sorriso. “E digo mais. Quando essas mulheres vão percebendo que têm direitos, elas começam a batalhar por eles.”

Desde o início de 2015, a instituição promove visitas ao acervo de grupos que sofrem com a vulnerabilidade social na comunidade local.
Mapa produzido pelas crianças das ocupações ao redor da Estação da Luz.

A Sala Futura promove ainda um projeto semelhante com outro grupo que sofre com a vulnerabilidade social: as transexuais. Em parceria com o Consultório na Rua, iniciativa da UBS Barra Funda, e em diálogo com outros equipamentos culturais, como o Museu da Pessoa e o Museu da Diversidade Sexual, o MLP organizou encontros que debateram a língua e o corpo como identidade, além de visitas ao seu acervo e uma ida ao cinema Reserva Cultural, onde o grupo assistiu o filme De Gravata e Unhas Vermelhas, que aborda essa temática.

“Quando mais da cidade for se descobrindo e tecendo essas redes de relação, aí sim cada um vai ser potente na sua particularidade”, finaliza Marina.

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