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publicado dia 19 de setembro de 2019

Governos locais contrariam federal e apostam em políticas públicas para o meio ambiente

Reportagem:

Na mesma semana em que o Brasil foi excluído da Cúpula do Clima que acontecerá na Assembleia Geral da ONU, no dia 23 de setembro, prefeitos e prefeitas de diversas cidades brasileiras e do mundo se reuniram em São Paulo para o encontro Catalisando Futuros Urbanos Sustentáveis

Leia +: Sociedade civil defende meio ambiente em manifesto

O evento, que acontece de 16 a 20 de setembro, convida lideranças de cidades que trabalham o meio ambiente em suas políticas públicas para debater problemáticas e compartilhar experiências de lida com a crise climática em esfera local. 

O jornalista André Trigueiro, que há trinta anos cobre a pauta do meio ambiente, fez uma fala contundente sobre a importância do encontro:

“Em sendo verdade e não há controvérsia na ciência em relação ao fato de experimentarmos uma crise ambiental sem precedentes, também é fato que não é possível resolver os impactos causados por essa crise sem multilateralismo. Sem um ambiente de cooperação internacional, sem estimular outras formas de governos locais, participação do terceiro setor e sem estigmatizar o ativismo.”

Ainda insistindo no contrapelo do evento, que olha para políticas públicas de proteção  ambiental no ano em que um mandato federal refuta o cientificamente provado aquecimento global e está esvaziando verbas para a ciência, o jornalista defendeu o uso de dados científicos para se pensar na pauta de sustentabilidade: 

“Estamos nesse evento exaltando a boa ciência em tempos de achismos e opinião. Você pode dizer que não acredita em aquecimento global no ponto de ônibus, na mesa de bar ou com seus amigos. Se você é autoridade pública e ocupa um cargo público, não o use para vincular opiniões. Porque não é uma questão de fé nem de credo: tem muita coisa em jogo e o custo da inação é muito superior ao que iremos enfrentar para mitigação e adaptação ante uma catástrofe climática.” 

Na presença de lideranças de mais de 105 cidades e 25 países, André comentou como é necessária a mobilização da governança local. 

“No século 21 não é possível deixar de considerar o poder local, a voz dos prefeitos como importantes catalisadores de movimentos e processos pelo meio ambiente. Prefeitos e prefeitas estão em contato direto com a população e as políticas públicas por eles criadas tem interferências direta na relação dos cidadãos com o clima. Ações como plantar árvores ou melhorar a mobilidade são decisões que passam diretamente por eles.” 

Dia 20 de setembro, jovens de diversas cidades no Brasil e no mundo realizarão a Greve Global pelo Clima, uma semana de manifestações pelo fim dos combustíveis fósseis e pelo Acordo Climático de Paris.

O Portal Aprendiz esteve no encontro e listou ações de quatro cidades brasileiras – três no nordeste e uma na região sul – que têm investido em políticas públicas de sustentabilidade e de preservação do meio ambiente: 

Caruaru (PE) 

A prefeita Raquel Lyra chama Caruaru de “uma cidade improvável, se considerada as condições geográficas onde foi erguida”. Município de médio porte, Caruaru está no semiárido pernambucano, na região com o pior balanço hídrico – onde há mais gente e menos água – e com cerca de 30% de sua população localizada na zona rural. A cidade também contém um forte polo industrial. 

Para lidar com as crises de tantas cidades dentro de uma, a gestão municipal resolveu olhar pela cidade de um ponto de vista territorial: “Não há solução fácil para problema difícil. Trabalhamos mobilidade, saneamento e resíduos sólidos fazendo uma leitura de território. Dividimos a cidade em territórios, criando serviços públicos e infraestruturas que condizem com o trecho onde serão implantadas.” 

Para lidar com a questão do lixo, a prefeitura apostou na construção de 120 ecopontos e galpões de triagem, e na parceria com associações de catadores locais. “Por conta desse trabalho, deixamos de enterrar 12 toneladas de lixo por semana e transformamos isso em adubo”, afirma a prefeita. O plantio de árvores para redução de emissão de CO2 também é uma estratégia. 

“Tentamos fazer as pessoas viverem bem onde elas vivem. Na zona rural, manter o cidadão no campo, dar incentivos para a agricultura familiar. Manter o cidadão de periferia bem assistido pelo Estado, construindo soluções como ciclovias que integram a cidade como um todo”. 

feira de agricultura familiar
Caruaru (PE) incentiva a agricultura familiar como política de sustentabilidade / Crédito: Prefeitura de Caruaru

Pelotas (RS) 

Fazendo quase fronteira com o Uruguai, Pelotas possuí patrimônios materiais e imateriais, tanto pela sua arquitetura como por sua produção doceira. A gestão pública, segundo a prefeita Paula Mascarenhas, tem olhado para a sustentabilidade não apenas como desafio de manter o meio ambiente para as gerações futuras, mas para melhorar a qualidade de vida dos habitantes no presente. 

O transporte público e seu impacto na mobilidade urbana é um dos dos desafios assumidos pela gestão. “Já temos mais de 50 quilômetros de ciclovias, superior a capital do estado, Porto Alegre. Também estamos iniciando nosso primeiro sistema de aluguel de bicicletas, aproveitando-se do fato da cidade ser muito plana.” 

Aconteceram também avanços de licitação de transporte coletivo tanto para zona urbana como para zona rural, o que permitiu a manutenção das tarifas e um incentivo para população buscar por transporte que não os automóveis. 

A gestão municipal olhou ainda para a coleta seletiva, que chega à 80% do município. “Trabalhamos com ecopontos, tentando estimular as pessoas a descartarem corretamente os seus resíduos e fazendo um trabalho muito forte com as cooperativas, o que também gera emprego e renda.” 

Lauro de Freitas (BA) 

Cercada por 13 praias e cortadas por cinco rios, Lauro de Freitas é a cidade mais próxima de Salvador, o que significa que há um grande contingente de pessoas que circula por seus 57 km² e é grande a procura para criar negócios na região. 

“Todo mundo quer empreender na cidade. E é muito bem-vindo. Mas tem que contribuir socialmente. Essa contrapartida é financiada pelas empresas que empreendem, e com isso criamos projetos de reflorestamento, revitalizamos vários parques e outras estruturas de atendimento ao público”, explica Moema Gramacho, prefeita da cidade. 

Por ser um município atravessado por diversos rios, tem sido também prerrogativa da gestão a manutenção das águas fluviais: “Faz três anos que fazemos uma obra de escoamento sanitário na cidade, o que vai aumentar de 30% para os 80% o tratamento da água. Também estamos tratando a água do rio central com uma bactéria natural que come as poluentes. Em um ano revitalizamos o rio.” 

Para lidar com os períodos de seca, a gestão também criou reservatórios de captação de água da chuva modulares: além de servirem para estocar a água, eles possuem uma estrutura que a construção de praças e parques esportivo. 

Recife (PE)

Cidade costeira, Recife é diretamente impactada pela crise climática. A previsão é de que ela seja uma das cidades brasileiras – junto com Belém e Rio de Janeiro – a mais sofrer com o aumento do nível do mar. 

“Recife reconhece a crise climática e assume o seu compromisso de cuidar dela”, afirma  Geraldo Júlio, atual prefeito. “Como parte desse compromisso, somos uma das primeiras cidades brasileiras a fazer um inventário de emissões de carbono para que nossa cidade pare de contribuir com a crise. Temos um plano de redução e esse ano fizemos a primeira aferição onde verificamos a redução das emissões.” 

O prefeito ainda afirmou que é necessário lidar com os dois tipos de população recifense: a que vive na zona costeira e que é imediatamente impactadas por alagamentos ou qualquer alteração marítima; e também a que vive na região dos morros, sujeita a deslizamento. 

“Os nossos compromissos locais são balizados por um pacote de planejamento urbano com participação da população. O plano foi mobilizado pela prefeitura mas feito pela sociedade civil organizada”, afirma o prefeito, se referindo ao Plano Diretor.

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