publicado dia 20 de dezembro de 2018
Conheça 5 cidades imaginárias do universo literário
Reportagem: Cecília Garcia
publicado dia 20 de dezembro de 2018
Reportagem: Cecília Garcia
“O escrito é como uma cidade, para a qual as palavras são mil portas”
Walter Benjamin
Não há estradas ou mapas que levem até elas. Ainda assim, muitas cidades imaginadas na literatura parecem mais palpáveis do que as reais, domando com suas centelhas fantásticas o imaginário humano. A quantidade de detalhes geográficos, culturais e sociais de cidades como a célebre Macondo, de “Cem anos de Solidão”, tantas vezes coloca uma lupa sobre as relações do território e seus habitantes.
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Para a pesquisadora Sandra Jatahy, no artigo “Cidades visíveis, cidades sensíveis, cidades imaginárias”, isso se dá porque a cidade foi, desde cedo, reduto de uma nova sensibilidade. “Ser citadino, portar um ethos urbano, pertencer a uma cidade implicou formas, sempre renovadas ao longo do tempo, de representar essa cidade, fosse pela palavra, escrita ou falada (…) Às cidades reais, concretas, visuais, tácteis, consumidas e usadas no dia-a-dia, corresponderam outras tantas cidades imaginárias, a mostrar que o urbano é bem a obra máxima do homem, obra que ele não cessa de reconstruir, pelo pensamento e pela ação”.
Nesta perspectiva, o Portal Aprendiz convida seus leitores e leitoras a conhecer 5 cidades imaginárias da literatura contemporânea – localidades que ajudam a formular novos jeitos de ler o mundo.
Pássaros que morrem por conta do calor dentro das casas; borboletas amarelas que acompanham amantes trêmulos dentro da banheira; insônias que tornam fosforescentes os olhos e levam uma população inteira ao esquecimento. Macondo, que apareceu em algumas obras do escritor colombiano Gabriel García Márquez e se tornou célebre em Cem Anos de Solidão, representa em seu nascimento atabalhoado – fruto de uma expedição que procurava o mar e nunca o achou – e no enlace do território com o clã Buendía muito da história latino-americana.
A geografia citadina do pouco habitado planeta Gethen, lar do universo distópico criado pela escritora norte-americana Ursula K. Le Guin, molda duramente seus habitantes. O planeta, também chamado de Inverno, vive em uma era glacial e embora isso se sinta menos nas cidades de Karhide e Orgoreyn, quase todo o resto do relevo é castigado por impiedosas paredes de gelo. Mas o traço mais agudo dessas capitais e de todo o planeta é que todos seres contêm em si ambos os sexos, o que torna as relações de gênero mais igualitárias e modifica profundamente as estruturas políticas e sociais.
Cidades Invisíveis (1972) – Italo Calvino
Como todas as cidades imaginárias do supracitado romance de Italo Calvino, Bauci combina uma humanidade gritante com a arquitetura surrealista. Sustentada em longas pernas de flamingo em cima de uma mata selvagem, a cidade de Bauci nunca toca a terra. Os humanos que vivem em sua suspensa e diáfana estrutura a observam de longe e, para isso, o narrador Marco Polo tem três hipóteses: que pela terra sentem repulsa; que a respeitam; ou que a amam profundamente, observando-a enamorados de binóculos “folha por folha, formiga por formiga”.
A maior cidade de Wakanda, país escondido entre montanhas da África Oriental, é o cintilante e tecnológico centro da trama do herói Pantera Negra. Exuberante em seu desenvolvimento científico, a capital ainda mantém tradições politeístas, evocando referências da mitologia egípcia e da cultura iorubá, além de ser um espaço de igualdade econômica e de gênero. Sua criação tem muitos elementos afrofuturistas, e ela pode ser considerada uma crítica à visão estereotipada dos países africanos e uma homenagem à sua riqueza cultural, tecnológica e social.
O universo do romance da escritora norte-americana e de origens nigerianas Nnedi Okorafor-Mbachu é habitado por árvores falantes, panteras telepáticas e uma tecnologia que brota diretamente das inteligentíssimas plantas da região. Na capital Ile-Ife, vive Zahrah, que é parte Dada, um híbrido de humanos e plantas. Enquanto o leitor acompanha o desenvolvimento da protagonista, ele é levado por uma sociedade que serve como analogia para os abismos e conexões entre humanidade e natureza.
*Imagem de capa por Luisa Riviera.