publicado dia 1 de junho de 2015
Estudo aponta que 77% das meninas acreditam que o machismo impacta seu desenvolvimento
Reportagem: Pedro Nogueira
publicado dia 1 de junho de 2015
Reportagem: Pedro Nogueira
Ao menos 12 garotas tentaram o suicídio nos bairros do Grajaú, Embu das Artes e Parelheiros, na zona sul de São Paulo, segundo apurou o portal R7 com informações de movimentos sociais de atendimento. Outras fontes garantem que entre duas e quatro meninas se mataram nos últimos meses.
O motivo? O “Top 10”.
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A prática consiste em montar rankings virtuais sobre supostas reputações sexuais de meninas, acompanhada de xingamentos diversos e fotos íntimas vazadas por parceiros, que são compartilhadas na internet, no Whatsapp e nos muros da região.
Uma pixação em um escadão na região do Grajaú, que ofendia uma garota da comunidade, motivou o coletivo “Mulheres na Luta”, a realizar um grafitaço com as meninas do local, no último dia 23 de maio, em parceria com a UBS local.
O “Grafitaço Feminista Top 10” parte da ideia de que sim, o machismo mata, de diversas formas e que, para combatê-lo, é preciso solidariedade e união. Para colocar isso em prática, tomaram os muros e chamaram todas as meninas que passavam pela região para participar, ajudar nos grafites e conversar sobre a questão.
“Se eu visse o Top 10 dois anos atrás, ia encarar como algo natural e achar que as meninas que foram bobas. A única atitude da direção da escola foi afixar cartazes com recomendações para fazer um boletim de ocorrência contra os agressores”, afirmou Vanessa Cândida, 17 anos, ao site Periferia em Movimento.
Machismo impacta desenvolvimento das mulheres
77% das meninas acreditam que o machismo impacta seu desenvolvimento. Essa foi uma das descobertas fundamentais da escuta feita pela Énois | Inteligência Jovem, em parceria com os institutos Vladimir Herzog e Patrícia Galvão e apresentada Durante o I Seminário Internacional Cultura da Violência contra as Mulheres. A pesquisa, que ouviu ao todo 2.300 mulheres de 14 a 24 anos das classes C, D e E.
No caso do Top 10, muitas meninas deixaram de ir às aulas, tiveram que mudar sua rotina de estudos e até procurar novas escolas. Mas, como revela o estudo, a forma como estruturamos nossa sociabilidade afeta as mulheres de diversas maneiras.
Por exemplo, 74% das entrevistadas acreditam ter tido um tratamento diferente em sua criação por serem mulheres; 90% deixaram de fazer alguma coisa por medo de violência – como ir à rua ou vestir determinadas roupas. Outro dado assustador da pesquisa aponta que 47% das entrevistadas já foram forçadas a ter relações com seus parceiros.
O depoimento de uma das meninas que participou do levantamento da Énois confirma esse cenário. “Eles ficam passando um pro outro [o TOP 10] pelo celular. Fiquei muito mal, passei alguns dias fechada em casa, sem ir pra escola. As pessoas mexiam comigo na rua”, relata a jovem.
Ruas = medo
E é na rua onde essa cultura toma forma: 84% das entrevistadas receberam afirmam já ter recebido agressões verbais, 77% já foram assediadas sexualmente – sendo que, desse total, 72% por desconhecidos; 94% foram assediadas verbalmente no espaço público.
“Um cara já chegou a passar a mão em minhas nádegas e xingou, ameaçando me bater quando protestei. Estava com minha mãe e meu irmão, de 4 anos na época, numa tarde de sábado, voltando do mercado”, relata uma paulistana de 24 anos.
Enquanto a rua é sinônimo de liberdade para os meninos, que vão brincar e socializar no espaço público, para as meninas, é sinônimo de medo e confinamento. “Esse comportamento – meninos na rua, meninas em casa – se perpetua ao longo da vida. Homens se sentem à vontade na rua e no transporte público, enquanto as mulheres ficam acuadas, controlando horários e peças de roupa”, acusa a pesquisa.
“Essa desigualdade impede que meninas tenham certas experiências e explorem seu potencial, seja para brincar, estudar ou explorar sua sexualidade. E, claro, o machismo também traz consequências para os meninos, impelidos a terem um comportamento mais agressivo e sexual”, contrapõe o estudo.
#meninapodetudo
Para visibilizar os resultados da pesquisa, sensibilizar familiares e a sociedade, a Énóis lançou a campanha online #meninapodetudo, que tem como objetivo “estimular a discussão e o compartilhamento de informações sobre o tema”. Quem quiser, pode usar a hashtag para contar suas histórias e dividir suas opiniões. Confira o relatório completo da pesquisa sobre gênero, juventude e espaço público.