publicado dia 20 de maio de 2015
5 fatores que comprovam a desigualdade social em São Paulo
Reportagem: Pedro Nogueira
publicado dia 20 de maio de 2015
Reportagem: Pedro Nogueira
Que São Paulo é uma cidade desigual não é novidade para ninguém. Com seu desenvolvimento radial, que conflui para o centro, criou uma ilha de riqueza cercada por mares de bairros e distritos sem investimento público, com altas taxas de vulnerabilidade e falta de serviços e equipamentos públicos.
Há oito anos, a Rede Nossa São Paulo, tem publicado versões atualizadas do Mapa da Desigualdade, como ocorreu nesta terça-feira, 19 de maio, no auditório do Sesc Consolação. Para o coordenador-executivo da frente que reúne mais de 700 organizações da sociedade civil, Maurício Broinizi, o problema da cidade continua o mesmo: excesso de centralização.
“A questão é a mesma, ano após ano: temos 96 distritos e em 80 deles existem faltas alarmantes de serviços públicos, de escassez de leitos em hospitais, de falhas na saúde e na educação”, pondera Broinizi. Para Oded Grajew, coordenador geral da Rede, “a desigualdade é a principal mancha na cidade. Dela decorrem nossos principais problemas e reduzi-la tem que ser nossa maior prioridade”.
Broinizi ressaltou a necessidade de “zerar os zeros”, ou seja, considerando que cada distrito de São Paulo é uma cidade de porte médio, deveria haver oferta completa de equipamentos para atender sua população em cada um desses territórios e, assim, começar a reduzir as desigualdades urbanas. Apesar dos pequenos avanços nos últimos anos, o abismo continua enorme. Confira abaixo, na tabela, a evolução de alguns indicadores que começaram a melhorar na cidade.
Broizini acredita que é possível mudar essa realidade desde que isso seja uma prioridade. “O Plano Diretor Estratégico da cidade, aprovado no ano passado, aponta nessa direção, quer levar empregos e equipamentos para longe do centro. Se ele for efetivado, em 15 anos, poderemos olhar um mapa muito diferente. Mas precisamos de pressão social para que a lei se cumpra”, completa.
Para ajudar a ilustrar o tamanho da tarefa que São Paulo tem pela frente, listamos cinco indicadores que revelam os abismos criados pela cidade. Confira abaixo.
1) Livros: Não tem biblioteca nem livro para todo mundo, mas para alguns tem ainda menos
Se você mora na região da Sé, bem guarnecida de bibliotecas públicas – que apesar dos apelos, fecham aos domingos e sábados à tarde -, você tem 16,28 livros a sua disposição. No Capão Redondo, são 0,5 per capta. Em outros 31 distritos, sequer existem bibliotecas. A taxa de desigualdade, medida pela Rede Nossa São Paulo, é de 11 mil vezes entre o Capão e o centro.
Enquanto a Unesco recomenda 2 livros disponíveis por habitantes, a cidade de São Paulo tem hoje 0,19, contra 0,27 em 2006. Em se tratando de livros infanto-juvenis, São quase dez na consolação contra 0,017 no Capão Redondo, enquanto outros 36 bairros aparecem zerados no índice, que não leva em consideração as bibliotecas dos Centros de Educação Unificados (CEUs).
2) Cultura: Teatros, cinemas e centro culturais são para poucos
Sessenta distritos de São Paulo não têm uma casa ou centro de cultura públicos, 59 estão sem cinemas e 51 sem teatros. Apesar dos dois primeiros terem crescido em número de salas de cinema e de espaços culturais (de 65 em 2006, para 95 em 2014) na cidade (o de teatros diminui desde 2011), isso pouco alterou a distribuição de equipamentos culturais pela cidade.
Na República, são 5,97 salas de teatro por 10 mil habitantes. No Sacomã, a taxa é 0,040, o mesmo número de salas de cinema por habitante na região, em comparação com o bairro da Barra Funda, que tem quase dez salas por 10 mil habitantes.
Os números absolutos de salas de teatro deixam evidente o abismo: são 272 salas de teatro para 11,5 milhões de paulistanos. O grupo Sinhá Zózima, que realiza espetáculos dentro de ônibus e no espaço público da cidade, afirma que em uma pesquisa feita por eles, em 2009, que 75% dos passageiros da cidade nunca foi a um teatro e 20% foi há mais de 20 anos.
3) Saúde: 30 distritos de São Paulo não têm nem um leito hospitalar
A recomendação do Ministério da Saúde é que uma cidade tenha 2,5 a 3 leitos hospitalares para cada habitante. Para os moradores do Jardim Paulista, essa taxa é mais do que respeitada: é multiplicada por onze. São 35,33 leitos por habitante, contando os hospitais públicos e privados.
No entanto, se você mora em Perus, Marsilac, Cidade Tiradaentes ou alguns dos 27 outros distritos afastados do centro de São Paulo, não há sequer um leito. Para efeito de comparação, Vila Medeiros tem 0,040 leitos por mil habitantes, que comparados com os quase 36, representam uma taxa de desigualdade de 881,09.
4) Violência: Para habitantes jovens de 16 distritos, não há homicídios. Para outros oitenta…
Em 2013, 644 jovens entre 15 a 29 anos morreram por causas violentas em São Paulo em 80 distritos da cidade. Nenhum deles estava em Perdizes ou nos outros 15 distritos com indicador zero. Em Marsilac, no extremo sul da cidade, para cada 10 mil jovens, quase 30 (28,60) foram assassinados. Os números de 2013 mostram uma queda em relação ao ano anterior, quando 777 jovens foram mortos, após a baixa histórica de 2011, com 389 mortes. Em 2005, foram computados 1.409 homicídios.
A mesma discrepância aparece no número total de homicídios. Um habitante de Perdizes tem 35 vezes menos chance de ser assassinado que um proveniente de Marsilac. Alto de Pinheiros e outros dois distritos centrais, aparecem zerados em homicídios totais, que em 2013, foram de 1.616. O total de homícidios segue a tendência das mortes na juventude, apresentando uma queda em 2013, após terem dobrado de 2011 (850) para 2012 (1741). Em 2005, foram 2785.
5) Educação: Cada vez mais mulheres trabalham, mas faltam vagas em creches de toda cidade
São Paulo passa por um enorme déficit de vagas em creches, que já foi alvo de um acordo entre o Tribunal de Justiça e a Prefeitura. Em 2008, 167.324 pedidos de matriculas para crianças de 0 a 3 anos foram feitos no município, contra 415.591 em 2014. Deste total, foram efetivados 109 mil matrículas, em 2008, e 228 mil, em 2014. Se o número de crianças atendidas dobrou, o percentual de pedidos de inscrições contemplados caiu de 65% para 55%.
Para Maurício Broinzini, da Rede Nossa São Paulo, os números apontam que cada vez mais mulheres entram no mercado de trabalho, mais qualificadas, mas o poder público ainda não consegue estar a par dessa transformação. “Hoje, muito mais mulheres completam os ensinos médio e superior que homens. Houve uma ampliação da entrada de mulheres no mercado de trabalho e temos que lutar para garantir que essas crianças sejam atendidas desde a primeira infância”, afirma.
A desigualdade na questão das creches não responde aos padrões do mapa. Alguns bairros periféricos, como Guaianazes, têm alto atendimento, com taxas de 80% de matrículas, enquanto na Sé apenas 23% das mães conseguem matrículas para seus filhos. Ainda assim, a situação é dramática em diversos bairros afastados do centro. Para além disso, a falta de vagas em creches cria desigualdades: as mães que podem pagar uma instituição de ensino privada, trabalha. Quem não pode, ou dá um jeito, ou desiste do emprego.