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publicado dia 18 de outubro de 2012

A educadora que reinventou uma escola

Por Mayara Penina

Maria de Fátima Borges mudou a realidade da EMEF Olavo Pezzotti, em São Paulo, quando todos acreditavam em seu fechamento.

Foi por escolha própria que a pedagoga Maria de Fátima Borges de Oliveira veio dirigir a Escola Municipal de Ensino Fundamental Olavo Pezzotti na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo.Fátima é moradora do Bom Retiro e atuava como diretora de uma escola no bairro de Pirituba, zona norte de São Paulo quando, em 1997, se candidatou ao cargo de diretora na escola da Vila Madalena.

Naquela época, havia rumores de fechamento da escola, tantos eram os problemas que ela enfrentava: baixo número de matrícula de alunos, paredes pichadas e banheiros destruídos. Mesmo com a “má fama da escola”, Fátima fez uma visita e gostou do que viu. “Eu já passei por escolas da rede pública na mesma situação e todas elas tinham um grande problema que o Olavo não tinha: botecos na porta. Por isso fiquei feliz, indiquei a escola e passei.”

O dia 2 de fevereiro de 1997 foi seu primeiro dia de trabalho. E ela decidiu colocar em prática os ensinamentos da “cartilha freiriana”: reconheça o território onde você está, descubra quem é a comunidade, o que ela tem, o que ela precisa ter e o que as pessoas gostariam que tivesse.

Uma de suas primeiras ações como diretora foi acionar os mecanismos da Prefeitura de São Paulo para a reforma do prédio. “É impossível estar em uma escola em que os banheiros não funcionam e que alaga quando chove. Isso aqui era um barro só.” A reforma terminou em 1999. “E eu não suspendi nenhum dia de aula”, orgulha-se. Aliás, desde a sua posse, ficou terminantemente proibido dispensar alunos. “Só se pegar fogo na escola”, brinca.

O principal eixo do trabalho da educadora era resgatar a confiança da comunidade que via a escola com maus olhos. Dizia para os professores: “Não podemos praticar injustiças, não podemos destratar ou desrespeitar uma criança. Ela pode até fazer isso com a gente, mas não podemos fazer igual. Fátima dá aos seus alunos a possibilidade de criticarem os professores e palpitarem nas regras disciplinares. “Temos que dar vez e voz para eles, senão, como é que aprendem?”

[stextbox id=”custom” float=”true”]Maria de Fátima trabalhou na Secretaria Municipal de Educação ao lado do educador Paulo Freire e de Luiza Erundina. “Larguei meu mestrado para este trabalho. Mas hoje vejo que me valeu mais que o diploma. Aprendi muito visitando as escolas, conversando com os professores, elaborando aulas, discutindo projetos.”[/stextbox]

Com todas essas ações e maneira de trabalhar a educadora conquistou a credibilidade da comunidade, estimulou os professores e, aos poucos, foi criando um ambiente menos hostil para o aprendizado. Saiu batendo às portas de vizinhos em busca de ajuda, o que rendeu parcerias com a Associação Cidade Escola Aprendiz, a PUC  – Pontifícia Universidade Católica,  a USP – Universidade de São Paulo – e a ACM – Associação Cristã de Moços, onde conseguiu apoio para a formação de seus professores.

“Eu queria quebrar aquele mito de que ninguém sabe quem é o diretor. Crianças e pais entram em minha sala a qualquer hora.” Foi por causa desse jeito autêntico que passou a ser bem vista por uns e um tanto mal vista por outros. “Alguns me veem como a diretora que não cumpre prazos e que não se dá bem com a papelada, porque minha prioridade é fazer as crianças terem aula. Já outros me veem como a diretora que conhece seus alunos pelo nome, que não deixa nenhum pai sem resposta, que sabe até quem foi o último a perder o dente”, afirma.

Antes de ser educadora

Maria de Fátima é a filha mais velha de uma família de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Por causa de seu pai, que era militar e não permitia que a filha estudasse, entrou tardiamente na escola, aos 8 anos de idade. Isso aconteceu graças à mudança para a casa de seu avô paterno, onde se alfabetizou em 3 meses.

Aos 17 anos, a jovem Fátima já militava na esquerda católica e apoiava a derrubada do regime militar. Ainda na adolescência, virou o amparo da família – o pai havia desaparecido. Para sobreviver, formou-se técnica em contabilidade e conseguiu um trabalho em uma empresa de brinquedos educativos, o que a incentivou a estudar pedagogia.

Entrou para a rede municipal de ensino aos 33 anos, por meio de um concurso. Passou entre os 100 primeiros colocados e tornou-se professora de uma escola na periferia de São Paulo, em São Miguel Paulista.

A despedida

A diretora vem, há anos, mantendo uma rotina de trabalho de mais de 12 horas. “Isso significa alguém que não cuidou da saúde: comecei a fumar por causa do stress, passei por um câncer e dois AVCs, estou com diabetes e hipertensão”, revela.

Para descansar e ter mais tempo para cuidar da saúde, Fátima decidiu aposentar-se. “Isso não significa vestir o pijama. Vou diminuir o ritmo, mas não vou parar, quem sabe vou ajudar em alguma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) ou me voluntariar em alguma ONG que trabalhe com crianças.

Antes da chegada do diretor efetivo, que deve acontecer em 2014, Fátima tem o desafio de preparar o professor assumirá seu lugar. Os candidatos já estão apresentando suas propostas e a escolha será feita pelo Conselho de Classe, formado por pais e alunos.

“Há uma temeridade de boa parte das pessoas de que a nova pessoa não dê continuidade aos projetos e quebre a relação que a gente tem com a comunidade. E é isso que dá mais trabalho. Aquele ‘jeitinho básico’ de chegar, despachar e pegar a bolsa quando dá o horário, não existe”, finaliza.

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