Conheça o trabalho do Coletivo Dedoverde e do Ecomuseu de Maranguape, que promovem a Educação Ambiental em seus territórios
Reportagem: Ingrid Matuoka | Edição: Tory Helena
Resumo: O Coletivo Dedoverde, na periferia de São Paulo (SP), e o Ecomuseu de Maranguape, na zona rural do Ceará, são duas iniciativas de Educação Ambiental e mobilização comunitária que se empenham em produzir soluções locais e promover o acesso aos bens culturais, tão desigualmente ofertado no Brasil, para somar forças no combate à crise climática. Conheça seus trabalhos.
Na periferia de São Paulo (SP) e na zona rural do Ceará existem duas iniciativas que vêm cultivando a relação entre as pessoas e a natureza ao redor, e garantindo o acesso dessas comunidades a conhecimentos e bens culturais. Duas frentes fundamentais para enfrentar a crise climática.
“Aqui falta muita informação para que as pessoas se importem com a questão ambiental, mas também porque aqui as prioridades são comer e trabalhar”, pontua Renato Rocha de Lima, fundador do Coletivo Dedoverde, articulador comunitário e educador ambiental.
É por esse último motivo que toda a atuação de Educação Ambiental do coletivo, em atividade desde 2010, é em conjunto com as Secretarias de Habitação, Saúde, Assistência Social e a Educação do município e outras organizações e movimentos dos bairros Jardim São Luís e Capão Redondo, em São Paulo (SP).
No espaço da unidade, há horta sem veneno, biodigestor, viveiros de abelhas sem ferrão, minhocário e fábrica de sabão. Lá, recebem crianças, jovens, professoras e pessoas da comunidade para vivências ecopedagógicas, além de também irem para outros espaços dos bairros dialogar e realizar projetos.
O território é banhado pela bacia hidrográfica Guarapiranga, rodeado pelo que restou da Mata Atlântica na cidade e vizinho do Parque Santo Dias, que possui uma nascente de água e animais nativos. Não faltam motivos para incentivar a população local a cuidar dos espaços naturais e urbanos.
“Utilizam muito as áreas verdes para lazer, mas jogam lixo, porque as pessoas não se sentem próprias desse lugar”, explica Renato, que vem atuando em conjunto com o parque para mudar essa realidade.
Em parceria com o Movimento de Moradia (MDE), organização social que está construindo dois prédios para 480 famílias em frente ao Parque Guarapiranga, o Coletivo Dedoverde iniciou um trabalho para que a reciclagem dos resíduos dos moradores possa ser fonte de renda para a manutenção do espaço.
“Mostramos que o resíduo tem valor e, quando isso começa a gerar renda, as pessoas entendem que tudo que a gente consome foi tirado de alguma matéria prima, mas pode ter vida prolongada e gerar renda”, explica.
Renato afirma que um dos maiores desafios da Educação Ambiental é incorporar novos hábitos no dia a dia “e quanto mais tarde a gente começa esse trabalho, mais difícil é”, mas não impossível.
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A mãe de Renato, que tem 88 anos, criou o hábito de deixar em um pote sobre a pia tudo que é orgânico e depois colocar em um biodigestor para servir de comida para as minhocas. O que é reciclável fica em um tambor que vai para o caminhão de reciclagem. Já Dona Lourdes, vizinha de 89 anos, criou um minhocário e uma horta em sua laje.
“Gosto de trazer esses exemplos para as pessoas começarem a fazer. Nunca é tarde mais”, diz Renato. Mas quanto antes esse trabalho começar, melhor. Por isso, boa parte da atuação do Coletivo é voltada para crianças, adolescentes e seus educadores e familiares.
Entre as atividades com escolas públicas e instituições educacionais das redondezas, realizam formações, projetos e atividades envolvendo os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), cisterna, composteira, minhocário, horta, nutrição, uso da água e desperdício de alimento.
Entre as atividades, realizaram junto a uma escola pública um museu eletrônico, em que todos foram convidados a levar equipamentos eletrônicos antigos e atuais para refletir sobre como a tecnologia avançou rapidamente, sem que um descarte adequado desses resíduos caminhasse na mesma proporção.
“A Educação Ambiental era para ser uma das pautas mais importantes de todos os setores, mas costuma ser a última das prioridades. Enquanto o debate não chegar na ponta, não vamos conseguir avançar”, observa Renato.
De casarão do coronel a museu da comunidade
Em meados do século 19, um coronel invadiu e se apossou de terras indígenas de Maranguape (CE), a 50 quilômetros de Fortaleza. Pelas mãos de escravizados, foram construídos um casarão, uma igreja e um açude no local. Aos poucos, foram surgindo casas ao redor.
Após o falecimento do coronel e abandono da região pelo restante de sua família, os moradores que viviam no entorno se juntaram, fundaram uma organização comunitária e financiaram a terra para ter posse dela definitivamente.
Hoje, essa organização administra coletivamente esse território e, entre as decisões tomadas, inauguraram em 2006, no antigo casarão, o Ecomuseu Maranguape, transformando o símbolo de violência em local de resistência e cuidado com as pessoas, suas histórias e o meio ambiente.
“A terra é coletiva e gerida por essa associação, e o casarão é o ponto central da comunidade e sede do nosso projeto”, explica Dalisson Cavalcante, que faz parte da coordenação do museu.
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Em parceria com o comitê agrícola do território, a associação comunitária, e a escola municipal José de Moura, o museu realiza formações para professores e estudantes.
“Os estudantes vivenciam a Educação Ambiental e Patrimonial para perceber como tudo está interligado. Eles conhecem a nossa história, nossa riqueza material, imaterial, natural e cultural, e passam a valorizar e cuidar disso, porque também é importante para combater as mudanças climáticas. Depois, são eles que apresentam o Ecomuseu para visitantes”, conta Dalisson, que foi formado por esse mesmo processo em 2007.
As atividades realizadas pela equipe do museu são diversas e sempre convidam crianças, adolescentes e suas famílias a colocar a mão na terra. Há, por exemplo, projetos de permacultura, práticas de agricultura familiar e criação de instrumentos musicais a partir de materiais recicláveis.
Também já fizeram fornos solares com as famílias. Feitos de caixa de papelão e revestidos com materiais recicláveis, basta colocar os equipamentos sob o Sol para cozinhar a comida.
Durante a pandemia, a estratégia foi recorrer ao mundo virtual para manter as formações. Em parceria com 25 escolas do município, criaram um aplicativo para mapear e reunir informações sobre o patrimônio cultural ao redor de cada unidade.
“Nosso desejo é despertar neles o conhecimento e a vontade de pesquisar a respeito, mostrando que patrimônio cultural também é sobre o meio em que a gente vive e os cuidados que precisamos ter para continuar a viver aqui”, diz Dalisson.