Articulação: caminhos para o bairro-escola

A constituição de um território educativo é movida por uma ideia essencial: todas as pessoas são capazes de aprender e efetivamente aprendem em diferentes lugares, com diferentes pessoas e ao longo de toda vida. Assim, a educação não se restringe à escola, mas se estende à vida na cidade e, como direito humano fundamental, deve se converter em uma responsabilidade coletiva.

Nesse sentido, articular e mobilizar redes para aprendizagem, valorizando os saberes e ofícios do território, dos equipamentos e sujeitos que ali estão instalados e atribuir neste processo intencionalidade educativa é estratégia fundamental para fomentar uma educação emancipadora e um território educativo.

Fundamental, mas nem sempre fácil. Articular demanda diálogo permanente com a comunidade, entendendo que essa aproximação nem sempre ocorre de maneira orgânica. Neste cenário, é importante que a escola se posicione como agente de transformação e que nas dinâmicas locais cotidianas possa  apresentar para crianças e jovens oportunidades de aprendizagem trazidas por temas como mobilidade urbana, alimentação, identidade, patrimônio, curas e rezas, memórias, entre outros.

Assim, o Projeto Integração se propôs a impulsionar a atuação da escola como articuladora dos potenciais educativos do território, sejam eles saberes, espaços ou intervenções, e apresentar aos mais diversos agentes locais a importância de um aprendizado contextualizado com a condição de vida das crianças e jovens que ali vivem. 

A atuação se deu a partir de 3 eixos prioritários que serão detalhados a seguir, assim como os resultados alcançados nas diversas etapas do projeto.

1. Reconhecer, vivenciar e incidir nas redes locais

2. Fortalecer a atuação de redes, movimentos e coletivos migrantes junto às escolas do território

3. Conectar redes, equipamentos e agentes em projetos que colaborem para a constituição de um território educativo

  1. 1. Reconhecer, vivenciar e incidir nas redes locais 

No processo de articulação, é importante considerar que cada território é único e possui histórias, conflitos e identidades próprias. Por isso, conhecer a população, o contexto social no qual está inserida e também as redes de apoio que ali atuam são caminhos importantes antes de dar início a uma trajetória de articulação.

Desde o surgimento de um território, as conexões entre grupos e pessoas já estão presentes. As dificuldades comuns, as principais mobilizações ou o desejo de tornar melhor o lugar onde se vive acabam resultando em processos articulatórios, nem sempre organizados e sistematizados, mas importantes para a construção da identidade de uma determinada comunidade.

Há alguns caminhos que podem ser utilizados para fortalecer as articulações já presentes e unir redes que ainda não estão em contato em torno de um objetivo em comum. Para fazer isso, no entanto, é importante reconhecer as redes articuladas que já atuam neste local, como elas se organizam, quem as integra e sua frequência.

  • Mapeamento

Para além do Diagnóstico Socioterritorial, o mapeamento das redes locais logo no início da atuação foi fundamental. Conhecer os vizinhos da escola, os familiares, quem tem atuado no território, as formas de atuação, quem são os trabalhadores locais, os equipamentos públicos e serviços sociais que compõem parte deste tecido social é o primeiro passo.

Conhecer as equipes de saúde, assim como os trabalhadores dos serviços sociais, é sempre uma ótima oportunidade para entender os desafios ainda enfrentados pela população, uma vez que estes espaços são, a priori, alguns dos mais procurados pela pessoas, pois garantem direitos básicos de qualquer ser humano, como educação, alimentação, saúde, entre outros.

Projeto Integração iniciou suas ações com um mapeamento da região central de São Paulo, tendo como ponto central uma escola de Educação Infantil  indicada pela Diretoria Regional de Educação do Ipiranga (DRE-Ipiranga): EMEI João Theodoro, reforçando aqui a metodologia do Bairro-Escola criada pela organização.

Algumas plataformas e sites, como a própria página da Secretaria de Educação, já trazem esses mapeamentos de maneira sistematizada, apontando onde estão as unidades escolares de uma determinada região, assim como a qual DRE ela pertence e também em qual modalidade de ensino se encaixa.

O mesmo acontece com as unidades de saúde (postos, UBS, AMAs) ou Centros de Referências de Assistência Social ou abrigos. Todos estes espaços também são mapeados pelas Secretarias a qual respondem, facilitando o trabalho de diagnosticar aqueles atores do território que podem ser possíveis parceiros.

Posteriormente, foi importante visualizar todos estes dados em um mapa propriamente dito, tornando possível identificar quais eram os “vizinhos” mais próximos uns dos outros e como poderiam articular ações.

Desse modo, foi realizado um mapeamento inicial utilizando a ferramenta do GoogleMaps, que permitiu visualizar quais eram as outras unidades escolares ao redor assim como os equipamentos culturais distribuídos pelo território, como museus, salas de teatro e oficinas, e os equipamentos e serviços sociais presentes no espaço.

Além do georreferenciamento dos equipamentos, agentes e serviços, a equipe do Projeto Integração organizou um mailing, uma lista com as principais informações dos pontos levantados no mapa (localização, telefone, email, etc.).  Como nem sempre os dados colhidos nos sites institucionais estão atualizados, a equipe contatou cada um dos locais para obter os dados mais recentes.

  • Articulação

Sem dúvidas, há uma grande variedade de modelos de articulação. Isso porque, como já apontamos, cada território é único, com suas histórias, infraestrutura e contexto socioeconômico e cultural.

O dinamismo e complexidade do bairro do Bom Retiro, Luz e adjacências não permite que tratemos esse território de forma simplista. A localidade possui uma diversidade étnica e social que devem sempre ser levadas em conta para quaisquer tipos de análise ou até mesmo projeções sobre a região.

Para além do mapeamento virtual realizado, sempre foi muito importante estar realmente presente neste espaço, com esforço para acompanhar e vivenciar junto aos grupos e serviços, suas reuniões, rodas de conversa, seminários e até mesmo encontros informais com  aquelas figuras tidas como articuladoras da região.

Esse movimento é uma estratégia importante para apoiar e fortalecer as redes já existentes e, para além disso, resgatar algo próximo do “espírito de comunidade”.

  • Mobilização

Ao menos na experiência que envolve o Bom Retiro, foi possível notar que a maioria dos atores e organizações envolvidas na rede intersetorial local se aproximam do grupo quando assim são convocadas, mas não espontaneamente. Desse modo, há ainda uma dificuldade de  permanecerem em rede e de olharem esse processo como algo contínuo e não apenas para a construção de eventos e atividades pontuais e esporádicas.

Por esta razão,  é importante que os sujeitos articuladores se esforcem para olhar para estes processos de  forma mais holística possível, garantindo que as costuras realizadas colaborem para chegar aos objetivos almejados.

Para além do mapeamento e do convite permanente à articulação, é essencial que o grupo esteja próximo constantemente, seja por meio de ferramentas digitais ou presenciais.

2. Fortalecer a atuação de redes, movimentos e coletivos migrantes junto às escolas do território

Um desafio que se instala na formação de redes é que muitas vezes o grupo entende a articulação como a junção de pessoas e organizações para a realização de algo palpável, como um evento, mas não a encara como a possibilidade de construir um plano a médio e longo prazo do bairro.

Assim, para que isso fosse possível, houve uma real aproximação da equipe de articulação do projeto aos variados serviços no território, para além da escola, como já apontado na seção Escola: agente de transformação .

Não é de maneira instantânea que os atores de um território começam a trabalhar e pensar ações em conjunto. É preciso propiciar espaços de troca constantes, para que as pessoas e organizações se conheçam e, mais do que fazerem parte de uma rede, fomentem a criação de outras micro redes.

Esse processo, no entanto, depende de um fator primordial e que, muitas vezes é ignorado frente às ferramentas tecnológicas presentes em nossa sociedade nos dias atuais: o vínculo afetivo. O afeto surge, aqui, como uma das ferramentas mais eficientes para trazer pessoas para perto em torno de uma mesma agenda.

Adquirir um olhar sensível ao local e abrir espaços de escuta ativa das pessoas envolvidas é um dos passos mais importantes para conseguir chegar a um objetivo em comum entre todas as pessoas envolvidas e, assim, começar a abrir espaço para a criação de vínculo entre os mais diferentes sujeitos.

Esse espaço, no entanto, também precisa ser construído, uma vez que cada ator possui suas próprias agendas anteriores e só se envolverá em um objetivo mais amplo se aqueles anteriores também estiverem contemplados.

Por esta razão, é importante pensar diagnósticos não apenas territoriais ou sociais, mas também de ideias e objetivos já presentes entre as mais diversas organizações; entender quais deles complementam ou criam interseção um com o outro; diagnosticar os desafios e potências de cada organização, até mesmo porque aquilo que é um problema para um grupo pode ser a  solução de outros.

Para que isso realmente aconteça, os encontros devem ser regados de afetividade. Um momento tão simples quanto o café pode propiciar conversas informais que podem até mesmo resultar em articulações de impacto no território. É importante que exista uma sistematização dos contatos constantemente e que haja espaço para as trocas informais, inclusive para que as micro-interações possam, então, começar a existir.

3. Conectar redes, equipamentos e agentes em projetos que colaborem para a constituição de um território educativo

  •  Equipamentos de Saúde

É impossível passar em frente à Unidade Básica de Saúde (UBS) do Bom Retiro e não se sentir convidado a entrar. O “bem-vindo” em quatro línguas diferentes logo na fachada já diz que ali não importa a nacionalidade de quem se aproxima, todos podem ser acolhidos.

No Diagnóstico Socioterritorial  realizado em maio de 2017 pela Cidade Escola Aprendiz, os principais agentes articuladores do território apontaram que a UBS é um dos espaços de maior referência no Bom Retiro e suas adjacências. Para eles, é um dos equipamentos públicos mais utilizados pela população.

Esta constatação pode ser comprovada também quando analisamos o resultado de pesquisa realizada com 57 famílias da EMEI João Theodoro. A UBS é o serviço público de saúde mais utilizada por esta amostra da população, sendo que 81,5% utilizavam este serviço, enquanto apenas 16,3% disseram que utilizam os museus da região, lembrando que a maior concentração de museus de toda a cidade de São Paulo está neste localidade, porém, a população residente ainda não usufrui desses espaços.

O diferencial, no entanto, vai além do atendimento de qualidade direto que as equipes da UBS já realizam: a unidade existe para muito além de seus muros, depositando um esforço real no intuito de chegar à comunidade do entorno, ultrapassando a ideia do atendimento e enxergando a saúde de maneira integral na vida da população local.

Há, porém, muitos desafios a serem percorridos pela unidade de saúde, que não possui uma sede com tamanho adequado à sua demanda de atendimentos. O espaço ainda é pequeno, com poucos consultórios de atendimento ou espaço para receber a população para outras atividades relacionadas à saúde.

Enquanto este problema não é solucionado, a unidade de saúde do local se engajou com outros serviços e espaços, a fim de oferecer atividades ligadas à saúde e qualidade de vida à população do entorno. O que poderia ser um problema para alcançar a comunidade do entorno, acabou se tornando uma oportunidade de ampliação da articulação da UBS no território.

Ao extrapolar as paredes da UBS, os profissionais da unidade puderam chegar aos e às moradoras do bairro por meio de oficinas que vão desde aulas de ginástica até encontros de chás que podem servir como medicina natural. Estas iniciativas integram o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), que integra a Estratégia Saúde da Família (ESF), uma política nacional e intersetorial.  

Quando a UBS ultrapassa seus muros, há uma oportunidade factível da área da Saúde conhecer a população e os mais diversos modos de vida de quem utiliza esse serviço, vendo-os para além do consultório, facilitando o trabalho de atendimento junto às famílias, uma vez que há maior credibilidade dessas pessoas em relação aos profissionais da saúde envolvidos nestas ações.

A UBS articula as escolas a partir do Programa Saúde na Escola (PSE) e permite que haja um acompanhamento constante das crianças do território em relação às suas necessidades. São realizadas reuniões mensais entre uma equipe multidisciplinar e as professoras e isso proporciona uma reflexão muito rica apontando caminhos para a solução de problemas. O que é visto como problemas por algumas educadoras não é para a saúde, mostrando quão importante é ter uma profissional da saúde próxima que entenda não só a técnica, mas também o contexto socioeconômico que as crianças estão inseridas.  

Por esse motivo, a equipe do projeto desde o início desta trajetória, se articulou com as equipes de saúde da UBS, entendendo-se que já existia um trabalho consolidado desse espaço junto à escola e que a agenda levantada por nós – a migração – também era uma demanda do equipamento de saúde, que começava a experimentar soluções e colocá-las em prática, como contratar agentes de saúde imigrantes. 

Participamos das atividades promovidas pelas equipes do PSE e PAVS, estivemos nas reuniões de organização e de planejamento, fortalecemos a agenda sobre a migração e diversidade do território junto a estes parceiros, resultando em processos que envolveram diversos outros atores, como é o caso do livro de receitas construído a muitas mãos.

Durante todo o ano de 2017, mais de 500 famílias foram envolvidas direta ou indiretamente no projeto Sabores e Saberes: memórias que atravessam tempos e espaços e que se entrecruzam nas escolas de seus filhos. A iniciativa envolveu três escolas da região: Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI) João Theodoro, Centros de Educação Infantil (CEI) Dom Gastão e Lar Criança Feliz.

Criado pela rede local do Programa Saúde na Escola (PSE), o projeto teve início quando as coordenadoras pedagógicas das escolas apontaram a necessidade de tornar o cardápio das unidades mais atrativo, resgatando o papel da alimentação no processo pedagógico e fomentando o envolvimento da comunidade com esse importante aspecto da vida das crianças.

Elas também acreditavam que era fundamental reconhecer e valorizar as trabalhadoras e trabalhadores da cozinha, aproximando-os da proposta pedagógica das escolas e ressaltando os aspectos culturais, sociais e comportamentais da comida. Surge assim a ideia de criar um livro de receitas.

O envolvimento de agentes do terceiro setor e coletivos que atuavam no território junto às escolas e equipamentos de saúde possibilitou nova ideias que compuseram o projeto . Para coletar os relatos em vídeos dos familiares, foi realizada uma parceria com O Mundo Cabe em SP, que desde 2015 registra histórias positivas de imigrantes em São Paulo. Criado pela produtora Alvorada Filmes, a iniciativa busca valorizar e divulgar as manifestações culturais dos povos que vivem na capital paulista, proporcionando uma maior integração entre as diversas culturas existentes.

Como parte das estratégias de vinculação com o território, o projeto Sabores e Saberes: memórias que atravessam tempos e espaços estimulou o compromisso dos diferentes atores com a saúde integral das crianças, mobilizando-os em prol do direito humano à alimentação adequada e também para olhar a diversidade enquanto potência

O projeto resultou em um documentário, um livro de receitas e uma exposição destas receitas realizada em conjunto com o Museu da Língua Portuguesa, que ficou exposta no hall de entrada da Estação da Luz, uma das estações de maior circulação de toda a cidade de São Paulo, permitindo que muitas famílias do território ou não pudessem se identificar com essas receitas e também com o projeto.

O projeto coletou 142 depoimentos sobre as memórias dos familiares relacionadas à alimentação. Da macarronada de domingo ao bolinho de chuva do fim da tarde, as narrativas revelam como as refeições eram preparadas, as distintas formas de organização das cozinhas, além das trocas e conversas que ocorriam durante as refeições.

Para que as entrevistas fossem realizadas, a equipe entregou um roteiro de perguntas aos familiares de cada escola. Nessa etapa, o esforço da educadora boliviana do CEI Lar Criança Feliz, Liliana Mamani, em traduzir para o Espanhol as perguntas formuladas assegurou a participação daqueles que não falavam português.

A partir dessa iniciativa, famílias vindas de outros países também se voluntariaram para traduzir o material, que acabou ganhando uma versão em mandarim. Além das questões, o roteiro convidava as famílias para uma gravação em vídeo.

As entrevistas em vídeo foram estrategicamente realizadas no horário de entrada e saída das crianças. Tudo aconteceu no pátio da escola, um espaço já conhecido pelas famílias, e a equipe de gravação estava sempre acompanhada pela coordenação pedagógica das unidades escolares e pelos profissionais da UBS.

O roteiro aplicado para as gravações tinha como desafio trabalhar as histórias de vida, respeitando as línguas e referências culturais dos entrevistados. Ao longo do processo, foi possível notar que nem sempre as memórias ativadas eram positivas e que, em alguns casos, essas lembranças revelavam as dificuldades vivenciadas pela pessoa em um determinado período.

Para que as crianças também pudessem, a seu modo, ser escutadas e contempladas no projeto, as escolas realizaram encontros práticos de produção das receitas citadas pelas famílias nos questionários. As educadoras planejaram atividades lúdicas que recuperavam a história do alimento, assim como músicas ou brincadeiras ligadas a ele.

  • Assistência Social

Assim como a unidade de saúde, os equipamentos de assistência social também são agentes importantes no processo de articulação do território, uma vez que estes espaços realizam um trabalho direto com a população que mora na região.

Desde o princípio do projeto houve um cuidado de se aproximar de redes que já atuavam no local, como é o caso do Fórum Regional de Defesa do Direito da Criança e do Adolescente da Sé (FRDDCA-SÉ), que existe desde de 2010 de forma mais articulada.

A equipe atuou junto à diretoria do fórum, apoiando e fortalecendo suas ações, assim como realizando um trabalho de interseccionar as agendas de assistência social à agenda da imigração, uma vez que há um grande número de famílias que vêm sendo atendidas pelos abrigos e estes vêm esta questão com uma grande demanda a ser dialogada tanto na gestão pública quanto no processo de formação dos educadores e assistentes sociais. 

Estar presente nas reuniões mensais permitiu criar uma relação afetiva e de confiabilidade entre diversos grupos e serviços, tanto que, em meados de julho de 2016, alguns dos representantes desses equipamentos estiveram presentes no Fórum Social Mundial das Migrações para contribuir com a discussão sobre os desafios dos serviços sociais frente a novos fluxos migrantes na cidade de São Paulo.

Para além desse momento muito rico de troca e também de intersecção de duas pautas extremamente importantes, o projeto apoiou a organização e realização do 1º Encontro Educador Social: desafios e possibilidades da profissão,  que contou com mais de 80 participantes envolvidos em debates e um World Café que trazia as mais diversas discussões que permeavam os serviços sociais, o que envolveu também uma mesa que trazia o tema da imigração para a discussão.

  • Serviço de Assistência Social à Família (SASF)

Os programas sociais e o acolhimento disponibilizados por estes espaços são ferramentas importantes no combate à desigualdade social. Isso não é diferente no Bom Retiro e demais localidades do entorno, onde equipamentos como o Serviço de Assistência Social à Família (SASF) Bom Retiro cumprem um papel muito importante de também aproximar as famílias atendidas pelos programas sociais aos mais diversos atores e equipamentos culturais do entorno.

Com uma equipe composta por assistentes sociais e agentes que realizam constantes visitas às famílias subsidiadas pelos programas sociais, o SASF é um espaço articulador e multiplicador de questões importantes presentes no território, como a moradia e a imigração, uma vez que atende diretamente os públicos que residem nas habitações ocupadas e também imigrantes recém-chegados ou que já residem há mais tempo no bairro.

A presença da equipe no território permitiu estar em contato contínuo com o SASF, uma vez que o serviço acolhe cerca de 200 famílias imigrantes de origem latino-americana. Desse modo, a atuação do projeto, que tinha como eixo principal pensar a diversidade cultural e promover o acesso aos bens culturais, enxergou no SASF também uma grande oportunidade de articulação e formação direta junto às famílias.

Após a aproximação inicial com o serviço, houve um processo de parceria no qual a equipe passou a realizar oficinas nos encontros socioeducativos que chegaram a reunir famílias inteiras, mas, essencialmente, mulheres, crianças e adolescentes.

Foram realizadas oficinas sobre o direito à educação, a importância do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o direito à cidade e também encontros práticos sobre identidade e representatividade que alcançaram cerca de 84 pessoas.  

No intuito de oferecer ferramentas para fomentar a discussão sobre os variados direitos sociais que essas populações podem ter acesso, mas também colaborasse na discussão sobre a diversidade cultural e étnica presentes no local.

Essas oficinas contribuíram, principalmente, para que a equipe compreendesse de maneira mais ampla os diversos contextos das famílias imigrantes latino-americanas. Com as oficinas, foi possível notar, por exemplo, que as mulheres imigrantes tinham muito interesse em participar de encontros que traziam a questão do direito à educação ou quaisquer outros que pudessem envolver suas filhas e filhos.

  • Equipamentos de cultura

Durante o Projeto Integração, a equipe da Cidade Escola Aprendiz teve sempre como ponto de partida a EMEI João Theodoro, escola na qual vem atuando desde 2016 sob o prisma da diversidade. E mapeando os serviços e equipamentos que estavam no raio de 2km da unidade escolar e, principalmente, aqueles que as famílias mais utilizavam.

Posteriormente, houve uma maior aproximação com os equipamentos de Cultura, entendendo-se que estes locais eram também atores importantes no processo de mobilização social, porém, pouco acessados pela população quando comparados aos outros equipamentos, uma vez que a região é a melhor servida de museus e casas de cultura de toda a cidade de São Paulo. 

Aproximar a população desses espaços sempre foi também um dos objetivos do projeto, principalmente no que tange a população imigrante, fomentando a participação dessas populações também a estes espaços.

Tendo em vista os processos articulatórios da Cidade Escola Aprendiz realizados em anos anteriores, o Projeto Integração também teve teve na cultura – e suas mais múltiplas dimensões – um eixo condutor de mobilização social, uma vez que, por meio da cultura ou, então, culturas, é possível acessar os sujeitos em suas diversas dimensões: emocionais, sociais, físicas e intelectuais.

Para além de pensar junto às redes locais formas de ampliar a frequência das famílias nestes equipamentos, a equipe colaborou sempre teve como premissa pensar as famílias das crianças das escolas como co-partícipes do processo cultural instaurado no território onde estão instalados.

As oficinas mencionadas acima, assim como o projeto de livro de receitas, foram verdadeiros processos de reconhecimento na diversidade cultural e das diversas identidades que compõem esse território, despertando também nos trabalhadores desses equipamentos este olhar. 

Rede Social Luz – Bom Retiro

A Rede Social Luz – Bom Retiro foi criada em meados de 2015, a partir do Senac Tiradentes, que passou a acolher encontros e realizar articulações com as redes já estabelecidas do território, mas também integrar novos sujeitos, em um esforço contínuo de apoiar as agendas de organizações que já atuavam no bairro, como as festas come

No fim de 2016, a equipe do Projeto Integração, após um longo período de aproximação e de criação de vínculo no território, passou a integrar rede junto a outros novos atores que atuavam no Bom Retiro ou que tinham consonância com as agendas levantadas pelo grupo naquele momento.

Durante o ano de 2016 foi estabelecida a criação de um Grupo Articulador da rede, formado por representantes de organizações que já tinham um perfil articulador no território e já realizavam micro-conexões com outros sujeitos, como o SASF-Bom Retiro, o PAVS (UBS Bom Retiro), a Cidade Escola Aprendiz, o próprio Senac, o Museu de Saúde Pública Emílio Ribas, o Instituto CRIAR, entre outros, que se aproximaram, mas não puderam continuar neste papel.

A ideia era colaborar, principalmente, com a sistematização das reuniões, da lista de contatos e no planejamento dos encontros e eventos que poderiam partir da rede, mas de uma maneira transparente e levando em consideração os anseios trazidos pelos demais integrantes da rede durante as reuniões e encontros mensais realizados durante todo o ano de 2017. Este grupo serviu muito mais para organizar as ideias que chegavam do grupo maior, em vez de tomar as decisões finais sobre a rede, que sempre foram tomadas de forma conjunta.

Conclusões

É muito importante colocar que uma rede é composta por fases distintas, que varia a depender de seus membros, contextos sociais nos quais estão inseridos, disputas, objetivos e anseios do território. Por isso, é impossível falar sobre a Rede Social Luz- Bom Retiro de uma maneira linear, pois ela tomou rumos distintos em momentos distintos.

Observou-se, durante a permanência do projeto no território, que muitas vezes é preciso criar alternativas criativas que aproximem mais os sujeitos do processo de articulação e que, majoritariamente, as pessoas envolvidas querem pensar ações mais práticas e urgentes, do que aquelas a médio e longo prazo.

Ressaltamos, aqui, que isso não é um problema, muito menos uma regra para todas as redes sociais, mas sim uma característica muito peculiar desta rede de maneira específica, que tinha na ação direta junto à comunidade o seu horizonte principal.

Isso se explica, também, pelo fato de a maior parte dos grupos que formam a rede serem de trabalhadores e trabalhadoras dos serviços sociais, educacionais e de saúde, que já têm em sua gênese, o contato direto com o público.

Esse contato, inclusive, serve como termômetro e é um grande privilégio dentro do trabalho em rede, pois essas pessoas podem ser grandes multiplicadoras das discussões que partem de uma rede como a do Bom Retiro e Luz, formada, essencialmente por organizações e não por moradores e moradores. Desse modo, os agentes comunitárias, os e as educadoras e assistentes sociais podem ser considerados verdadeiras pontes entre a rede e o território como um todo.

Durante todo o ano de 2017, a rede realizou encontros mensais, eventos , diagnóstico socioterritorial, mapa de atores, desafios e potências, que culminaram no “Que Bom Retiro”, uma ação intersetorial unindo áreas completamente distintas, mas que, durante o processo se viram complementares. O festival reuniu diversas atrações voltadas às crianças, seminário sobre educação e migração, visitas a museus, roteiros pelas ruas, oficinas, apresentações artísticas, cinema a céu aberto e rodas de conversa sobre a região com o objetivo da própria comunidade ocupar o território, trazendo suas histórias de vida e desejos.